apologética
Assembléia de Deus: origem e carismas
Fonte: Mundo Catolico
Autor: D. Estevão Bitencour
Transmissão: José Augusto
Autor: D. Estevão Bitencour
Transmissão: José Augusto
ASSEMBLÉIA DE DEUS: ORIGEM E CARISMAS
D. Estêvão Bettencourt
Em síntese: A Assembléia de Deus é uma denominação protestante neopentecostal que tem origem nos Estados Unidos e conseguiu grande número de adeptos no Brasil. Caracteriza-se pela emotividade e a vivência de carismas ordinários e extraordinários.
A Assembléia de Deus foi, até poucos anos atrás, a denominação protestante que mais cresceu no Brasil. Hoje em dia a liderança é disputada por outras correntes neopentecostais. Examinemos a origem da Assembléia de Deus e algumas notas que a caracterizam.
1. Origem do neopentecostalismo protestante Assembléia de Deus é uma modalidade do movimento neopentecostal norte-americano, que teve início nos seguintes termos:
1.1 O Pentecostalismo clássico é uma forma de reavivamento fundamentalista do protestantismo norte-americano.
Está ligado com um tipo de reavivamento metodista chamado Holiness (Santidade), que se originou na segunda metade do século XIX. Os seus mentores julgavam que os metodistas negligenciavam a doutrina de seu fundador John Wesley (? 1791), concernente à "inteira santificação". Segundo esta, o cristão que já tivesse feito a experiência da conversão (necessária para a salvação), devia aspirar a uma "segunda bênção", isto é, a uma nova e mais profunda experiência religiosa; esta tornaria o cristão apto à vida de perfeição moral, sem sentir perturbação proveniente de algum resquício do pecado. Tal experiência nova era tida como "batismo no Espírito Santo" ou também Holiness. Esta segunda experiência teria índole meramente interior e subjetiva, ficando independente de qualquer sinal exterior que a denotasse.
Ora aconteceu no ano de 1900 que o pastor metodista Charles F. Parham aderia às concepções de Holiness. Tinha uma escola para estudos bíblicos em Topeka (Kansas, U.S.A.) com trinta alunos, de ambos os sexos. Adotava o método de propor uma pergunta, para a qual os estudantes tinham de procurar os textos bíblicos que pudessem servir de resposta.
Certa vez, interrogou: "Quais são os sinais que, na Bíblia, caracterizam o autêntico batismo no Espírito Santo?" - Na base de At 2, 1-12; 10, 44-48; 19, 17, Parham e seus discípulos concluíram que o único sinal seguro era o dom das línguas (glossolalia). Então grande entusiasmo apoderou-se do grupo, que se pôs a rezar ininterruptamente durante vários dias e noites, pedindo a vinda do Espírito Santo. A 1 ° de janeiro de 1901, uma das estudantes, Agnes Oznam, pediu a Parham que lhe impusesse as mãos sobre a cabeça enquanto orava; quando isto foi feito, ela experimentou o "batismo no Espírito" e começou a falar línguas: "Sentiame como se rios de água viva jorrassem do mais profundo do meu ser", declarou ela mais tarde. Dentro de poucos dias Parham e os outros membros do grupo fizeram a mesma experiência.
Assim surgiu a primeira congregação pentecostal, distinta dos grupos Holiness pela convicção de que o genuíno batismo no Espírito há de ser manifestado, como no primeiro Pentecostes, pelo dom das línguas; esse batismo não visa apenas à santificação pessoal dos crentes, mas também os fortalece para que possam dar público testemunho de Cristo num apostolado eficiente, assinalado por outros dons do Espírito; entre estes, o da cura dos doentes por imposição das mãos de um pregador tem importância eminente. O primeiro núcleo pentecostal de Topeka deu origem a outros; espalhou-se pelo Texas e em 1906 estava em Los Angeles, sob a direção de um pastor de cor chamado W. J. Seymour, o qual aderira anteriormente à espiritualidade de Holiness.
A exaltação e o entusiasmo demonstrados por esses grupos fizeram que as comunidades batistas e metodistas tomassem distância do movimento. Verdade é que Parham, Seymour e os outros iniciadores do Pentecostalismo não tencionavam fundar nova denominação cristã, mas apenas suscitar um revival ou reavivamento no seio das comunidades protestantes. Quando porém, se viram rejeitados por estas, passaram a constituir congregações próprias, hoje conhecidas pelo termo genérico de "pentecostais", que nos Estados Unidos contam com um total de cerca de dois milhões de membros.
Nenhuma denominação protestante está sujeita a se dividir e subdividir tanto quanto a dos pentecostais. Isto se compreende, dado que as raízes e as forças impulsoras do movimento são assaz subjetivas e arbitrárias. Passemos à
2. Assembléia de Deus: origem
Tendo tido origem em 1900, o movimento pentecostal expandiu-se rapidamente até a Suécia, a índia, a América Latina...
Em 1914 organizou-se nos Estados Unidos com o nome de General Council (Assembléia Geral). Naquele ano vários pastores pentecostais reuniram cerca de cem congregações diferentes em Hot Springs, Arkansas (U.S.A.), dando-lhes o nome único de Assembléia de Deus.
O Pentecostalismo que originou a Assembléia de Deus no Brasil, foi trazido em 1910 (5 de novembro) por dois missionários suecos- Gunnar Vingren e Daniel Berg. O primeiro nasceu a 08/08/1879, de família batis ta; em 1903 foi para os Estados Unidos, onde recebeu "o Batismo do Espírito Santo" e começou a falar em línguas, dizia que, juntamente com outros companheiros, durante a oração "sentia o poder de Deus sobre si como uma pressão". A decisão de vir para o Brasil foi-lhe inspirada diretamente pelo Espírito Santo, como refere o pastor Lawrence Olson:
"Cremos que o Espírito Santo chama certas pessoas para realizar determinados trabalhos missionários. A chamada divina é essencial para quem se lança ao trabalho no exterior e mesmo para os trabalhos missionários dentro do país. Como o Espírito Santo chamou Paulo e Bamabé em Antioquia para saírem ao trabalho missionário, assim hoje também Deus chama seus servos, embora nem sempre em profecia, como naquele caso. Em 1910 o Espírito Santo chamou dois jovens suecos, por nome Gunnar Vingren e Daniel Berg, em South Bend, Est. Indiana, E. U.A., por mensagem em línguas estranhas, proferidas por um irmão Uldin, em cuja casa estavam hospedados. Sendo repetida tantas vezes a palavra 'Pará-Pará-Pará', entenderam que para algum lugar por esse nome Deus os estava chamando. Verificaram então na Biblioteca Municipal que Pará era o nome dum Estado do Norte do Brasil. Oraram a Deus. Sentiram que era o Brasil para onde Deus os chamara. O caminho abriu-se e em Novembro de 1910 chegaram a Belém do Pará, onde iniciaram a obra das Assembléias de Deus no Brasil, obra conhecida de todos, de culto nacional, congregando hoje cerca de 1 milhão de membros" (Ênfases do Movimento Pentecostal. O Espírito Santo e o Movimento Pentecostal, São Paulo 1966, p. 28).
Na autobiografia de Daniel Berg, um dos fundadores da Assembléia de Deus no Brasil, narram-se as circunstâncias maravilhosas que marcam a sua vida, especialmente a sua vinda para o Brasil: "A melhor forma de saber a vontade de Deus, era orar, foi o que fizemos durante uma semana, dia e noite. Finalmente, Deus confirmou que devíamos ir para o Pará.
Se ainda houvesse qualquer dúvida, esta desapareceria dias mais tarde, quando o irmão Vingren, durante um de seus longos passeios de meditação, ouviu claramente uma voz que lhe falava ao ouvido dizendo: `Se vós fordes, nada vos faltará'. Vingren voltou-se rapidamente para ver quem falava tão claramente, porém não viu ninguém. Era o Senhor a confirmara chamada.
Não ficamos surpreendidos ao saber que havia dois lugares no navio, que não foram ocupados. O Senhor havia preparado todas as coisas e até aquela hora, de modo que tínhamos a certeza de que ele cuidaria também dos lugares no navio. Compramos as passagens e embarcamos.
De repente, percebi, ao longe, dois objetos que vinham em direção ao barco, um atrás do outro, em grande velocidade. Quando se aproximaram, vi que eram dois peixes. O que vinha na frente era grande, maior que os peixes comuns, o que vinha a persegui-lo era ainda maior. Estávamos observando como nadavam, rápidos como flexas, quando o peixe perseguido deu um pulo e caiu no meio do barco. Era a resposta à oração que fizemos ao Senhor, para que nos desse alimento para o jantar. Agradecemos a Deus, mesmo antes de o preparar para comer.
`Todos os tripulantes se alegraram e viram, com seus próprios olhos, como Deus prepara alimento para seus filhos. O peixe tinha excelente paladar. O cozinheiro declarou que aquela espécie é rara naquela região, o maior exemplar que vira desde muito tempo. Quando o Senhor dá alguma coisa, dá sempre o melhor. As suas bênçãos, possibilidades, e querer, são maiores do que podemos imaginar. E uma verdade que até mesmo nas pequenas coisas, nos acontecimentos diários e na variada espécie de problemas, sentimos a mão de Jesus dirigindo-nos pelo melhor caminho" (D. Berg, O Enviado por Deus, Casa Publicadora das Assembléias de Deus, Rio de Janeiro, sem data, pp. 30-35.166s).
Segundo os historiadores do Pentecostalismo protestante, "avisos", "revelações", "sonhos proféticos" são alguns dos sinais carismáticos que acompanham a expansão do movimento. Narra, por exemplo, Emílio Conde, encarregado pelos pentecostais de escrever a "História das Assembléias de Deus no Brasil", o seguinte episódio, que é típico do que ainda hoje freqüentemente acontece nos cultos pentecostais:
"Para convencer um povo de coração duro, e confirmar uma Obra iniciada em meio tão hostil, o Senhor manifestou o Seu poder ante os olhares atônitos dos descrentes. Certa noite, em um culto realizado na Vila Coroa (Belém), apareceu um homem endemoninhado que se retorcia com violência sem que alguém o pudesse segurar. Os descrentes que assistiam, tentaram imobilizá-lo, porém não conseguiram. Em dado momento a irmã Josina Galvão, começou a profetizar e, cheia do poder de Deus, dirigiu-se para onde estava o homem endemoninhado. Em nome de Jesus impôs-lhe as mãos e ordenou ao demônio que se retirasse. Ante a admiração geral, o homem ficou imobilizado, de cócoras, dominado pelo poder de Deus; todos viram que algo como um raio saiu pela janela e desapareceu. Os descrentes que estavam fora de casa, e a tudo assistiam, amedrontados, confessavam que Deus estava no meio daquele povo" (B. Muniz de Soares, A Experiência da Salvação, São PauIn 1989 n 33)
A Assembléia de Deus logo se expandiu para outras regiões do Brasil a partir de Belém, onde a primeira congregação contava dezoito pessoas. Já em 1913 o primeiro mensageiro brasileiro partiu para Portugal; em breve outros se lhe seguiram. Vejamos algumas características do neopentecostalismo protestante em geral.
3. Assembléia de Deus. Emotividade
A quem entra num templo pentecostal, muito impressiona o entusiasmo com que os crentes rezam, cantam e gesticulam. Isto atrai muita gente necessitada de ser reanimada; é capaz de produzir um frenesi contagiante, que faz bem a muitos, ao menos momentaneamente. A liturgia católica, ao contrário, é mais sóbria e contida (hierática), sendo, por causa disto, às vezes censurada.
Em resposta a esta observação, notamos que a emoção faz parte integrante da personalidade humana e, por isto, não pode ser menosprezada. Mas a reta ordem manda que ela esteja subordinada à inteligência, pois o homem é, antes do mais, um ser racional, cujo intelecto deve reger todo o seu comportamento. A emotividade é algo de subjetivo (cada indivíduo reage a seu modo no plano emocional), ao passo que a inteligência concebe referenciais objetivos duradouros, capazes de estruturar o comportamento de todos os homens; ora a inteligência afirma que, diante de Deus, o fiel tem que assumir uma atitude de reverência e respeito, que não se coaduna com expressões demasiado livres e subjetivas.
Aliás, várias denominações protestantes mais tradicionais rejeitam o caráter emocional do Pentecostalismo. Entre os próprios pentecostais, alguns chegam a desaprovar a excessiva descontração de seus irmãos nas assembléias de culto.
Acontece, porém, que, para compreender o valor de atitudes sóbrias e hieráticas na Liturgia, é necessário um tanto de cultura ou de formação doutrinária; é preciso saber apreciar o silêncio, valorizar a medita ção, intuir os valores invisíveis... Ora estas atitudes se tornam difíceis não somente pelo pouco cultivo intelectual de boa parte da população, mas também por causa de um certo anti-intelectualismo derivado de Lutero e Calvino e transmitido às gerações protestantes em geral.
A Igreja Católica, em sua sobriedade (que não deixa de falar vivamente quando a Liturgia é bem executada), vai mais ao fundo do ser humano; ela toca as instâncias básicas da pessoa e oferece a possibilidade de uma fé mais sólida, mais consciente, mais abrangente. Mas precisamente por causa disto a Igreja sofre e sofrerá desvantagens em relação aos múltiplos grupos pentecostais, que improvisam suas manifestações e podem chegar a obcecar ou fanatizar seus membros. A unidade da Igreja se prende ao seu amor pelos valores objetivos ou à Verdade e ao Bem objetivos, ao passo que o subjetivismo solapa o protestantismo e o esfacela cada vez mais.
4. O Dom das línguas
Não há dúvidas de que o Espírito Santo pode conceder dons extraordinários, inclusive o das línguas, aos seus fiéis. Todavia diante do extraordinário impõe-se uma posição de sobriedade, para que não se confundam fenômenos psicológicos e parapsicológicos com as graças de Deus.
O psiquismo humano guarda no seu inconsciente notícias e experiências latentes, que podem vir à tona de maneira imprevista e confusa quando a pessoa perde o habitual controle de si mesma: um forte empolgamento emocional, uma viva excitação religiosa podem levar o indivíduo a pronunciar palavras estranhas ou mesmo de outro idioma (percebido em conversas de colegas, de companheiros de viagem, de amigos estrangeiros...). Isto acontece ainda mais facilmente se o fiel está sugestionado e acredita que vai receber o dom das línguas associado ao "Batismo no Espírito Santo". A sugestão move o inconsciente a funcionar mais rápida e generosamente.
Com isto, não queremos negar a possibilidade de uma efusão especial do Espírito Santo, doador de graças, mas desejamos chamar a atenção para o risco de se confundirem fenômenos heterogêneos e dar valor (= autoridade e importância) descabido a manifestações do sujeito, que, sob a capa de inspiração divina, pode estar impondo seu modo de ver pessoal.
5. As Doenças
Um dos fatores que mais contribuem para a propagação das correntes pentecostais, são as curas de doenças tidas como milagrosas. A propósito convém apresentar a mentalidade segundo a qual os pentecostais freqüentemente consideram as moléstias. A doença é, muitas vezes, tida como punição... punição do pecado. Eis os depoimentos oriundos dos lábios de crentes pentecostais: "A doença é um castigo de Deus. Embora Ele não envie a doença, permite que o Diabo a envie para o mau crente como castigo, ou, até mesmo, para aquele crente que Deus quer provara sua fé. Assim como Deus abençoa até mil gerações aos que fazem a Sua vontade, Ele também castiga, através do Diabo, até a terceira geração. Por isso os filhos ficam às vezes doentes por causa dos pecados dos pais, ou para glorificação de Deus pela fé" (ob. cit., p. 167).
"A doença vai do pecado, até do pecado original. Se uma pessoa ou seus antepassados conheceram a verdade e depois cometeram mal perante Deus, são castigados por Ele. Deus só castiga aqueles que cre ram e pecaram. Nós estamos aqui para orar em vigília, para não cair e ficar aleijados, para não ter um câncer. Para ir para Cristo, temos de orar todos os dias, com muita fé, para que Jesus nos livre dos ataques do Diabo, que traz as doenças" (ob. cit., p. 168).
Se tal é a origem das doenças, entende-se que a cura há de ser obtida, antes do mais ou talvez até exclusivamente, através da oração. Eis outro testemunho: "Todas as doenças vêm do Diabo, mas podem ser evitadas pelo asseio e pela abstinência. Na vida eterna, não existirão mais doenças e provações. O médico, com a permissão de Deus, pode curar. Quando eu fico doente, oro e peço a Deus para ser curado. Não sendo curado, procuro aumentar minha fé; não conseguindo, apelo para a medicina".
Os crentes mais extremados afirmam envergonhar-se de recorrer ao médico ou tomar remédios, pois "este pode ser um dos meios de que se vale Satanás para enfraquecer nossa fé na cura de Jesus". Um fiel entrevistado concluiu, de modo convicto: "Quem não tem fé, pode ser curado pelo médico. Os crentes novos às vezes são fracos, duvidam da cura. Por isto vão ao médico, mas depois se convencem de que só Deus é quem cura". Eis outro depoimento:
"O crente, quando tem muita fé e crê firmemente em Jesus, não procura médicos. Ele ora para o Senhor, que é o médico dos médicos. Agora, quando o crente não tem fé suficiente, não é capaz de orar com convicção; ele pode procurar a ciência da terra, pode tomar remédio" (ob. cif., p. 143). As pretensas curas obtidas no espiritismo são tidas como "curas enganadoras, de que se vale o diabo para conquistar as almas".
Tendo procurado terreiros de umbanda e sessões espíritas antes de conhecer o Pentecostalismo, um dos informantes, adepto da seita, declara:
"A cura do Espiritismo é a cura do corpo, mas a alma se perde. Satanás também tem o dom de fazer milagres, mas faz para o mal. O demônio é uma criatura desesperada. Faz curas, mas a diferença está em que a pessoa curada pelo Espiritismo não crê em nada, a pessoa não muda porque não crê, continua uma pessoa do mundo. Eu mesmo fui curado pelo Espiritismo, antes de me converter. Fui ao centro espírita, tomei o remédio que mandaram e sarei. O mal, porém, continuou dentro de mim, pois não acreditava em nada. Agora sou diferente porque estou salvo por Jesus" (ob. cit., pp. 169s).
Doenças e Maravilhosas Curas
Muitas pessoas são atraídas pelas correntes religiosas que prometem e "realizam" curas maravilhosas de doenças graves. - Para explicar os portentos assim efetuados, é oportuno lembrar que existem moléstias funcionais devidas a um bloqueio do psiquismo do paciente; tais doenças podem ser, ao menos aparentemente, curadas pelo desbloqueio do enfermo provocado por sugestão ou por impacto; tenham-se em vista os placebo. A Teologia católica reconhece o milagre, mas só o faz após rigoroso exame de cada caso a fim de averiguar se não há explicação natural para o mesmo. Em linguagem católica, quando se diz que "a fé cura", entende-se que a fé predispõe o paciente abrindo-o para a graça; só Deus pode realizar milagres.
Um dos fatores que muita gente atraem ao Pentecostalismo, são as propaladas curas de doenças que a medicina não consegue debelar, ou para tratar das quais o paciente não tem recursos financeiros. De resto a prática da medicina não científica, mas "mística", sempre esteve em voga, constituindo o que se chama "o curandeirismo".
Para entender o fenômeno, é preciso considerar um preliminar importante.
6. Doenças e "doenças"
Toda doença é psicossomática, isto é, afeta o físico (soma) e o psíquico do paciente. Há, porém, doenças mais acentuadamente ligadas ao psíquico (são as doenças ditas "funcionais") e outras mais fortemente ligadas ao físico (são as doenças orgânicas). As doenças funcionais estão muito relacionadas com fatores emotivos, que causam certo bloqueio do sistema nervoso e, conseqüentemente, disfunção ou paralisia de órgãos ou sistemas do organismo.
Tais são certas moléstias da pele (eczema, verrugas, urticária), furunculose, asma, úlcera do estômago, angina do peito, insuficiência hepática, colite, hemorragias... Visto que a causa destas doenças é freqüentemente um bloqueio psíquico, basta eliminar esse bloqueio pela sugestão, pela transmissão de otimismo e confiança, para que a moléstia desapareça.
As doenças orgânicas são as que decorrem de uma lesão ou agressão ao físico: o câncer, a cegueira por perda do nervo ótico, as fraturas... Estas não dependem tanto de sugestão; por isto não são curadas por vias "místicas", ao passo que as primeiras o podem ser. Além disto, observemos que há doenças ilusórias... Certas pessoas de boa fé apresentam todos os sintomas de doenças funcionais ou mesmo orgânicas. Na verdade, porém, não sofrem senão dos efeitos de sua sugestionabilidade. Em tais casos, o curandeiro pode produzir "curas maravilhosas".
Há também doenças mal diagnosticadas tidas como graves, quando na verdade não o são. Após a cura, proclama-se a ocorrência de milagre, quando na realidade não o houve. Feita esta observação preliminar, passamos a estudar as diversas modalidades da medicina não científica.
7. As curas do Pentecostalismo
a) Se alguém vai a uma igreja acreditando que o demônio lhe está causando tal ou tal enfermidade, é submetido a um "exorcismo" e recebe a bênção do pastor. Em conseqüência, passa a se sentir bem ou curado. Ora nesses casos pode-se dizer que, de modo geral, não há mais do que psicoterapia baseada na sugestão: auto-sugestão, hétero-sugestão, sugestão coletiva do ambiente, sugestão hipnótica, contágio mental. O pastor e a assembléia aplicam ao paciente gestos e ritos que o desbloqueiam; se o doente acredita que esses gestos e ritos têm poder de curar, ele há de se sentir aliviado ou pretensamente curado.
É conhecido o funcionamento dos placebo (= agradarei). São remédios aparentes, inoperantes, que produzem efeito benéfico, porque excitam a sugestão positiva do paciente. Sim, a psicologia ensina que um órgão humano pode entrar em atividade tanto sob influência de seus excitantes naturais (remédios adequados) como sob a excitação de estimulantes que são meramente convencionais. Por conseguinte, caso se diga a alguém que determinado objeto ou determinada fórmula ou determinado tratamento é benéfico para o corpo, pode acontecer que, embora tais objetos ou fórmulas... sejam de todo indiferentes e inoperantes, a pessoa que, impressionada ou sugestionada, os aplique a si, experimente um benefício corpóreo. Tal "estímulo-sinal" terá produzido verdadeira reação biológica favorável à cura, por causa da confiança e da convicção do paciente; será oportuno até para recolocar em atividade um órgão paralisado do organismo do paciente.
Estas reações, ditas "reflexos condicionados", elucidam a eficácia atribuída a certos processos da "medicina" supersticiosa: trata-se de agentes inócuos em si, mas transformados em fatores benéficos por causa da convicção que o paciente, após haver sido (consciente ou inconscientemente) doutrinado, nutre a respeito de sua "eficácia".
Em conseqüência, vê-se que não há dificuldade em admitir o bom êxito da seguinte receita dos curandeiros: quem queira curar-se de verrugas, procure um osso no campo, friccione a verruga com a parte do osso que estava voltada para o chão, coloque de novo o osso no lugar e vá-se embora às carreiras... O tratamento pode dar resultado, pois afirmam os médicos que a verruga pode ser combatida pela sugestão (cf. Dr. A. da Silva Mello, Mistérios e Realidades deste e do outro Mundo. Rio 1950, 421).
b) Pergunta-se, porém: se a ação do curandeiro cura por sugestão, por que a ação do médico não tem a mesma força sugestionante? Na verdade, há pacientes que passam pelos médicos sem obter resultados, mas sob os cuidados do curandeirismo se dizem sanados.
A resposta não é difícil: a ação do médico é freqüentemente muito objetiva; ele não trata o doente, mas a doença. Ao contrário, a ação do curandeiro é essencialmente subjetiva; ela se exerce sobre o doente, e não sobre a doença. Diante do médico, o doente toma uma atitude tímida e fechada, pois a superioridade fria do médico o assusta. Ao invés, entre o curandeiro e seu cliente há um relacionamento de intensa afetividade: "ele é o grande homem, o milagreiro que já curou tantos, o único que ainda poderá salvar o paciente!".
Levemos em conta a aura de mistério que cerca o curandeiro benfazejo: o próprio local de atendimento onde reina concentração anormal ou o frenesi coletivo de uma massa fanatizada; as conversas sobre casos maravilhosos já ocorridos e que os clientes vão recordando durante o tempo de longa espera do seu atendimento; os meios mirabolantes dos passes, dos toques, das insuflações ou os berros e as exclamações daqueles que "esconjuram o demônio", e daqueles dos quais saem os maus espíritos; a ânsia de recuperar a saúde, custe o que custar... Isto tudo contribui para suscitar no paciente a mais inabalável certeza de que será curado, se se entregar sem resistência à ação do curandeiro (ou do pastor "exorcista"). Se a doença não for orgânica (como parece que, de fato, não é em 83% dos casos), o curandeiro conseguirá resultados que o médico seria incapaz de obter.
Também é de notar que freqüentemente os médicos dizem ao hipocondríaco que ele não tem doença, mas imagina tê-la. Muitos pacientes, com isto, sentem-se incompreendidos e ofendidos. O curandeiro, porém, já pelo fato de ter pouca instrução, não fala assim. Em vez de negar a doença, promete ao cliente que será curado ou já está curado. Ora a psicologia reconhece que o procedimento do curandeiro é mais eficaz do que o do médico, no caso.
c) Em conseqüência, impõe-se uma observação: não se deve dar fácil crédito à proclamação de fenômenos portentosos (especialmente curas médicas e cirúrgicas), mas, antes de procurar-lhes a explicação, é necessário investigar exatamente se houve algum fato extraordinário e em que consistiu propriamente. Portanto a quem anuncia uma cura, é preciso pedir:
1) uma declaração médica a respeito da doença ou do estado de saúde da pessoa em foco antes de passar pelo "tratamento".
2) uma declaração médica atestando a cura total e duradoura da moléstia por via inexplicável aos olhos da ciência. Sem estes atestados, poderíamos estar procurando as causas de milagres que nunca houve, embora o paciente se diga curado. Quem deve dizer se houve realmente cura, é o médico, após fazer os devidos exames científicos. A seriedade e honestidade científica é imprescindível em tais casos.
A explicação dada atrás vale para as doenças funcionais, não para as doenças orgânicas ou para as doenças que dependem não de lesão física, mas de perturbação do sistema nervoso. As doenças funcionais ou nervosas ou mesmo as doenças orgânicas de origem nitidamente psíquica ou nervosa não vêm ao caso, quando se trata de milagre na apologética ou na teologia. Ao contrário, interessam as lesões orgânicas nitidamente diagnosticadas e tidas como incuráveis pela medicina contemporânea. Caso sejam curadas em um contexto de fé e prece puras, pode-se admitir aí uma intervenção extraordinária de Deus ou um milagre.
Verifica-se, porém, que nas comunidades pentecostais não se realiza o exame médico-científico do paciente antes da cura e depois da cura, para saber se houve, de fato, a eliminação radical do mal ou apenas um paliativo. Os dirigentes e os fiéis aclamam "o milagre", que geralmente é ilusório, se se trata de doença orgânica. Um dos grandes inconvenientes do curandeirismo consiste em fazer que o enfermo acredite estar salvo de moléstia, quando, na verdade, esta permanece incubada; por causa do alívio momentâneo, o paciente deixa de se tratar; entrementes o mal progride em seu organismo de tal modo que, quando o paciente dá por ele, já se encontra muito mais atacado do que antes de pretensa cura.
8. Circunstâncias que abonam ou desabonam
Todo milagre é um sinal ou uma palavra de Deus aos homens. Ora, para que essa palavra possa ser reconhecida e utilizada como testemunho válido para todos os homens, é necessário que ela tenha certas características. Estas podem ser negativas e positivas.
8.1. Critérios negativos
Não são reconhecidos como milagres fenômenos realizados em contexto indigno de Deus:
a) Tais seriam, em primeiro lugar, os ambientes de irreverência a Deus, imoralidade ou deboche de costumes, charlatanismo ou ilusionismo, cobiça de lucros materiais ou aceitação de lucro financeiro por parte do pretenso taumaturgo, ocasião de satisfazer ao orgulho, à vaidade ou à sensualidade das pessoas envolvidas no portento... O Senhor Deus não pode ser incoerente ou contraditório; Ele não realiza sinais ou palavras portentosas que de algum modo possam sugerir a confirmação do deboche, da fraude ou da imoralidade...
b) Ambientes de sensacionalismo e alarde levam igualmente a desconfiar da autenticidade do "milagre". - Na verdade, as obras de Deus costumam ser discretas, mesmo quando derrogam ao curso natural dos acontecimentos. Um portento exageradamente sensacional já não seria sinal, pois não levaria os espectadores a procurar outra realidade invisível assim assinalada. Alimentaria a fantasia e a curiosidade profanas mais do que a inteligência, a fé e a reverência a Deus.
c) O espírito de arrogância e de domínio com que alguém trate as coisas de Deus e os fenômenos prodigiosos, também resulta em desabono do pretenso milagre. Quem julga ter direito a algum milagre, porque possui ciência e receitas ou porque é virtuoso e sempre foi fiel a Deus, já se coloca fora das disposições necessárias para ser atendido pelo Senhor Deus. O autêntico milagre é sempre sinal gratuito, nunca é devido por Deus ao homem. O homem não "encomenda" milagres a Deus. Somente quando assume uma atitude de humildade e disponibilidade, pode o homem esperar receber a graça e a condescendência de Deus.
8.2. Critérios positivos
Uma vez enunciadas as características que, no sentido teológico e apologético, desabonam o milagre, importa averiguar as que o recomendam e autenticam aos olhos do observador. Para que uma cura de enfermidade venha a ser levada em conta como possível resposta de Deus aos homens, deve, segundo a jurisprudência da Igreja, preencher as cinco seguintes condições:
1) Trate-se de uma doença orgânica grave, consistindo em alterações anatômicas (modificação, perda ou hiperprodução de tecidos...). Essa doença terá sido diagnosticada pelos métodos mais seguros e haverá sido considerada totalmente incurável aos olhos da medicina contemporânea.
2) Tenham sido ineficientes todos os meios terapêuticos devidamente aplicados.
3) Verifique-se a restauração dos órgãos ou tecidos lesados em espaço de tempo tão breve que possa ser considerado instantâneo.
4) Não se tenha registrado o prazo ordinariamente necessário para a recuperação gradual da função lesada (a pessoa curada conseguiu logo caminhar ou comer e digerir com toda a normalidade...). Ou, em outros casos, não se tenha verificado o prazo necessário para a reabsorção dos edemas, dos derrames de pleura ou para a destruição das massas de tumores - o que não exclui ritmo progressivo (mas rápido) do estado geral de saúde da pessoa curada (aumento de peso, de forças, etc.).
5) Seja a cura duradoura, capaz de ser comprovada por exames sucessivos, feitos a intervalos regulares durante longo espaço de tempo. É importante frisar que o quadro mais normal dentro do qual o milagre se insere, é o da prece humilde, destituída de crendices ou artifícios supersticiosos. O prodígio aparece então como a resposta de Deus ao apelo da miséria do homem. Este não é capaz de comprar ou de forçar o favor de Deus; não há preces ou ritos de efeito infalível; a oração agradável a Deus é a que procede de um coração filial, voltado para o Pai do céu em confiança e amor, sem "receitas" prévias "garantidas".
9. A fé que salva
A expressão "a tua fé te salvou", freqüente nos lábios de Jesus (cf. Mt 8, 13; 9, 2.22.15, 28; 17, 20), não quer dizer que os milagres sejam projeções do psiquismo subjetivo do paciente (faith healing, Ia foi qui guérit). Há, sem dúvida, casos de cura por auto-sugestão; tenham-se em vista as moléstias funcionais que são criadas e extintas por sugestão do próprio paciente.
A fé, de resto, não é sugestão subjetiva. A fé que Jesus louva nos Evangelhos como penhor de salvação, significa abertura para Deus cheia de entrega e confiança. Está claro que uma tal disposição acalma o sis tema nervoso do paciente, mas é incapaz de explicar a cura radical do mesmo, quando afetado de certas lesões orgânicas. A autêntica fé, ademais, é precedida por um juízo da razão; longe de ser cega ou sentimental, ela supõe o conhecimento dos motivos de credibilidade: por que posso crer?... por que crer precisamente em Jesus de Nazaré?... por que crer na Igreja Católica, e não em outra comunidade religiosa? O estudo de tais perguntas exige o funcionamento da razão e da lógica, contribuindo assim para emancipar da sugestão, do sentimentalismo e do fanatismo a autêntica fé cristã.
De resto, a fé não dispensa o homem de servir-se dos recursos que Deus lhe dispensa para livrar-se de seus males. Se Deus deu ao homem inteligência, não pode deixar de querer que o ser humano a utilize para atingir seus fins legítimos. Omitir-se neste setor, esperando que Deus faça milagrosamente o que o homem pode fazer inteligentemente, é tentar a Deus; é falsa devoção. A S. Escritura mesma elogia o médico e recomenda o recurso ao médico, ao mesmo tempo que reconhece que Deus é a fonte de todo o saber e de toda a perícia do médico; veja-se Eclo 38, 1-12:
"Rende ao médico as honras que lhe são devidas, por causa de seus serviços, porque o Senhor o criou. Pois é do Altíssimo que vem a cura, como um presente que se recebe do rei. A ciência do médico o faz trazer a fronte erguida, ele é admirado pelos grandes... O Senhor é que deu a ciência aos homens, a fim de que se gloriem com suas obras poderosas. Por eles, Ele curou e aliviou, o farmacêutico fez com eles misturas... e por ele a saúde se difunde sobre a terra.
Filho, não te revoltes na tua doença, mas reza ao Senhor, e Ele te curará... Dá lugar ao médico, porque o Senhor também o criou; não o afastes de ti, porque dele tens necessidade. Há ocasião em que a saúde está entre suas mãos". Sobre o milagre e seu autêntico significado, ver outrossim nosso Curso sobre Ocultismo, Módulos 5, 6 e 21. {Pergunte e Responderemos - abril de 2003}
Remetido por José Augusto
D. Estêvão Bettencourt
Em síntese: A Assembléia de Deus é uma denominação protestante neopentecostal que tem origem nos Estados Unidos e conseguiu grande número de adeptos no Brasil. Caracteriza-se pela emotividade e a vivência de carismas ordinários e extraordinários.
A Assembléia de Deus foi, até poucos anos atrás, a denominação protestante que mais cresceu no Brasil. Hoje em dia a liderança é disputada por outras correntes neopentecostais. Examinemos a origem da Assembléia de Deus e algumas notas que a caracterizam.
1. Origem do neopentecostalismo protestante Assembléia de Deus é uma modalidade do movimento neopentecostal norte-americano, que teve início nos seguintes termos:
1.1 O Pentecostalismo clássico é uma forma de reavivamento fundamentalista do protestantismo norte-americano.
Está ligado com um tipo de reavivamento metodista chamado Holiness (Santidade), que se originou na segunda metade do século XIX. Os seus mentores julgavam que os metodistas negligenciavam a doutrina de seu fundador John Wesley (? 1791), concernente à "inteira santificação". Segundo esta, o cristão que já tivesse feito a experiência da conversão (necessária para a salvação), devia aspirar a uma "segunda bênção", isto é, a uma nova e mais profunda experiência religiosa; esta tornaria o cristão apto à vida de perfeição moral, sem sentir perturbação proveniente de algum resquício do pecado. Tal experiência nova era tida como "batismo no Espírito Santo" ou também Holiness. Esta segunda experiência teria índole meramente interior e subjetiva, ficando independente de qualquer sinal exterior que a denotasse.
Ora aconteceu no ano de 1900 que o pastor metodista Charles F. Parham aderia às concepções de Holiness. Tinha uma escola para estudos bíblicos em Topeka (Kansas, U.S.A.) com trinta alunos, de ambos os sexos. Adotava o método de propor uma pergunta, para a qual os estudantes tinham de procurar os textos bíblicos que pudessem servir de resposta.
Certa vez, interrogou: "Quais são os sinais que, na Bíblia, caracterizam o autêntico batismo no Espírito Santo?" - Na base de At 2, 1-12; 10, 44-48; 19, 17, Parham e seus discípulos concluíram que o único sinal seguro era o dom das línguas (glossolalia). Então grande entusiasmo apoderou-se do grupo, que se pôs a rezar ininterruptamente durante vários dias e noites, pedindo a vinda do Espírito Santo. A 1 ° de janeiro de 1901, uma das estudantes, Agnes Oznam, pediu a Parham que lhe impusesse as mãos sobre a cabeça enquanto orava; quando isto foi feito, ela experimentou o "batismo no Espírito" e começou a falar línguas: "Sentiame como se rios de água viva jorrassem do mais profundo do meu ser", declarou ela mais tarde. Dentro de poucos dias Parham e os outros membros do grupo fizeram a mesma experiência.
Assim surgiu a primeira congregação pentecostal, distinta dos grupos Holiness pela convicção de que o genuíno batismo no Espírito há de ser manifestado, como no primeiro Pentecostes, pelo dom das línguas; esse batismo não visa apenas à santificação pessoal dos crentes, mas também os fortalece para que possam dar público testemunho de Cristo num apostolado eficiente, assinalado por outros dons do Espírito; entre estes, o da cura dos doentes por imposição das mãos de um pregador tem importância eminente. O primeiro núcleo pentecostal de Topeka deu origem a outros; espalhou-se pelo Texas e em 1906 estava em Los Angeles, sob a direção de um pastor de cor chamado W. J. Seymour, o qual aderira anteriormente à espiritualidade de Holiness.
A exaltação e o entusiasmo demonstrados por esses grupos fizeram que as comunidades batistas e metodistas tomassem distância do movimento. Verdade é que Parham, Seymour e os outros iniciadores do Pentecostalismo não tencionavam fundar nova denominação cristã, mas apenas suscitar um revival ou reavivamento no seio das comunidades protestantes. Quando porém, se viram rejeitados por estas, passaram a constituir congregações próprias, hoje conhecidas pelo termo genérico de "pentecostais", que nos Estados Unidos contam com um total de cerca de dois milhões de membros.
Nenhuma denominação protestante está sujeita a se dividir e subdividir tanto quanto a dos pentecostais. Isto se compreende, dado que as raízes e as forças impulsoras do movimento são assaz subjetivas e arbitrárias. Passemos à
2. Assembléia de Deus: origem
Tendo tido origem em 1900, o movimento pentecostal expandiu-se rapidamente até a Suécia, a índia, a América Latina...
Em 1914 organizou-se nos Estados Unidos com o nome de General Council (Assembléia Geral). Naquele ano vários pastores pentecostais reuniram cerca de cem congregações diferentes em Hot Springs, Arkansas (U.S.A.), dando-lhes o nome único de Assembléia de Deus.
O Pentecostalismo que originou a Assembléia de Deus no Brasil, foi trazido em 1910 (5 de novembro) por dois missionários suecos- Gunnar Vingren e Daniel Berg. O primeiro nasceu a 08/08/1879, de família batis ta; em 1903 foi para os Estados Unidos, onde recebeu "o Batismo do Espírito Santo" e começou a falar em línguas, dizia que, juntamente com outros companheiros, durante a oração "sentia o poder de Deus sobre si como uma pressão". A decisão de vir para o Brasil foi-lhe inspirada diretamente pelo Espírito Santo, como refere o pastor Lawrence Olson:
"Cremos que o Espírito Santo chama certas pessoas para realizar determinados trabalhos missionários. A chamada divina é essencial para quem se lança ao trabalho no exterior e mesmo para os trabalhos missionários dentro do país. Como o Espírito Santo chamou Paulo e Bamabé em Antioquia para saírem ao trabalho missionário, assim hoje também Deus chama seus servos, embora nem sempre em profecia, como naquele caso. Em 1910 o Espírito Santo chamou dois jovens suecos, por nome Gunnar Vingren e Daniel Berg, em South Bend, Est. Indiana, E. U.A., por mensagem em línguas estranhas, proferidas por um irmão Uldin, em cuja casa estavam hospedados. Sendo repetida tantas vezes a palavra 'Pará-Pará-Pará', entenderam que para algum lugar por esse nome Deus os estava chamando. Verificaram então na Biblioteca Municipal que Pará era o nome dum Estado do Norte do Brasil. Oraram a Deus. Sentiram que era o Brasil para onde Deus os chamara. O caminho abriu-se e em Novembro de 1910 chegaram a Belém do Pará, onde iniciaram a obra das Assembléias de Deus no Brasil, obra conhecida de todos, de culto nacional, congregando hoje cerca de 1 milhão de membros" (Ênfases do Movimento Pentecostal. O Espírito Santo e o Movimento Pentecostal, São Paulo 1966, p. 28).
Na autobiografia de Daniel Berg, um dos fundadores da Assembléia de Deus no Brasil, narram-se as circunstâncias maravilhosas que marcam a sua vida, especialmente a sua vinda para o Brasil: "A melhor forma de saber a vontade de Deus, era orar, foi o que fizemos durante uma semana, dia e noite. Finalmente, Deus confirmou que devíamos ir para o Pará.
Se ainda houvesse qualquer dúvida, esta desapareceria dias mais tarde, quando o irmão Vingren, durante um de seus longos passeios de meditação, ouviu claramente uma voz que lhe falava ao ouvido dizendo: `Se vós fordes, nada vos faltará'. Vingren voltou-se rapidamente para ver quem falava tão claramente, porém não viu ninguém. Era o Senhor a confirmara chamada.
Não ficamos surpreendidos ao saber que havia dois lugares no navio, que não foram ocupados. O Senhor havia preparado todas as coisas e até aquela hora, de modo que tínhamos a certeza de que ele cuidaria também dos lugares no navio. Compramos as passagens e embarcamos.
De repente, percebi, ao longe, dois objetos que vinham em direção ao barco, um atrás do outro, em grande velocidade. Quando se aproximaram, vi que eram dois peixes. O que vinha na frente era grande, maior que os peixes comuns, o que vinha a persegui-lo era ainda maior. Estávamos observando como nadavam, rápidos como flexas, quando o peixe perseguido deu um pulo e caiu no meio do barco. Era a resposta à oração que fizemos ao Senhor, para que nos desse alimento para o jantar. Agradecemos a Deus, mesmo antes de o preparar para comer.
`Todos os tripulantes se alegraram e viram, com seus próprios olhos, como Deus prepara alimento para seus filhos. O peixe tinha excelente paladar. O cozinheiro declarou que aquela espécie é rara naquela região, o maior exemplar que vira desde muito tempo. Quando o Senhor dá alguma coisa, dá sempre o melhor. As suas bênçãos, possibilidades, e querer, são maiores do que podemos imaginar. E uma verdade que até mesmo nas pequenas coisas, nos acontecimentos diários e na variada espécie de problemas, sentimos a mão de Jesus dirigindo-nos pelo melhor caminho" (D. Berg, O Enviado por Deus, Casa Publicadora das Assembléias de Deus, Rio de Janeiro, sem data, pp. 30-35.166s).
Segundo os historiadores do Pentecostalismo protestante, "avisos", "revelações", "sonhos proféticos" são alguns dos sinais carismáticos que acompanham a expansão do movimento. Narra, por exemplo, Emílio Conde, encarregado pelos pentecostais de escrever a "História das Assembléias de Deus no Brasil", o seguinte episódio, que é típico do que ainda hoje freqüentemente acontece nos cultos pentecostais:
"Para convencer um povo de coração duro, e confirmar uma Obra iniciada em meio tão hostil, o Senhor manifestou o Seu poder ante os olhares atônitos dos descrentes. Certa noite, em um culto realizado na Vila Coroa (Belém), apareceu um homem endemoninhado que se retorcia com violência sem que alguém o pudesse segurar. Os descrentes que assistiam, tentaram imobilizá-lo, porém não conseguiram. Em dado momento a irmã Josina Galvão, começou a profetizar e, cheia do poder de Deus, dirigiu-se para onde estava o homem endemoninhado. Em nome de Jesus impôs-lhe as mãos e ordenou ao demônio que se retirasse. Ante a admiração geral, o homem ficou imobilizado, de cócoras, dominado pelo poder de Deus; todos viram que algo como um raio saiu pela janela e desapareceu. Os descrentes que estavam fora de casa, e a tudo assistiam, amedrontados, confessavam que Deus estava no meio daquele povo" (B. Muniz de Soares, A Experiência da Salvação, São PauIn 1989 n 33)
A Assembléia de Deus logo se expandiu para outras regiões do Brasil a partir de Belém, onde a primeira congregação contava dezoito pessoas. Já em 1913 o primeiro mensageiro brasileiro partiu para Portugal; em breve outros se lhe seguiram. Vejamos algumas características do neopentecostalismo protestante em geral.
3. Assembléia de Deus. Emotividade
A quem entra num templo pentecostal, muito impressiona o entusiasmo com que os crentes rezam, cantam e gesticulam. Isto atrai muita gente necessitada de ser reanimada; é capaz de produzir um frenesi contagiante, que faz bem a muitos, ao menos momentaneamente. A liturgia católica, ao contrário, é mais sóbria e contida (hierática), sendo, por causa disto, às vezes censurada.
Em resposta a esta observação, notamos que a emoção faz parte integrante da personalidade humana e, por isto, não pode ser menosprezada. Mas a reta ordem manda que ela esteja subordinada à inteligência, pois o homem é, antes do mais, um ser racional, cujo intelecto deve reger todo o seu comportamento. A emotividade é algo de subjetivo (cada indivíduo reage a seu modo no plano emocional), ao passo que a inteligência concebe referenciais objetivos duradouros, capazes de estruturar o comportamento de todos os homens; ora a inteligência afirma que, diante de Deus, o fiel tem que assumir uma atitude de reverência e respeito, que não se coaduna com expressões demasiado livres e subjetivas.
Aliás, várias denominações protestantes mais tradicionais rejeitam o caráter emocional do Pentecostalismo. Entre os próprios pentecostais, alguns chegam a desaprovar a excessiva descontração de seus irmãos nas assembléias de culto.
Acontece, porém, que, para compreender o valor de atitudes sóbrias e hieráticas na Liturgia, é necessário um tanto de cultura ou de formação doutrinária; é preciso saber apreciar o silêncio, valorizar a medita ção, intuir os valores invisíveis... Ora estas atitudes se tornam difíceis não somente pelo pouco cultivo intelectual de boa parte da população, mas também por causa de um certo anti-intelectualismo derivado de Lutero e Calvino e transmitido às gerações protestantes em geral.
A Igreja Católica, em sua sobriedade (que não deixa de falar vivamente quando a Liturgia é bem executada), vai mais ao fundo do ser humano; ela toca as instâncias básicas da pessoa e oferece a possibilidade de uma fé mais sólida, mais consciente, mais abrangente. Mas precisamente por causa disto a Igreja sofre e sofrerá desvantagens em relação aos múltiplos grupos pentecostais, que improvisam suas manifestações e podem chegar a obcecar ou fanatizar seus membros. A unidade da Igreja se prende ao seu amor pelos valores objetivos ou à Verdade e ao Bem objetivos, ao passo que o subjetivismo solapa o protestantismo e o esfacela cada vez mais.
4. O Dom das línguas
Não há dúvidas de que o Espírito Santo pode conceder dons extraordinários, inclusive o das línguas, aos seus fiéis. Todavia diante do extraordinário impõe-se uma posição de sobriedade, para que não se confundam fenômenos psicológicos e parapsicológicos com as graças de Deus.
O psiquismo humano guarda no seu inconsciente notícias e experiências latentes, que podem vir à tona de maneira imprevista e confusa quando a pessoa perde o habitual controle de si mesma: um forte empolgamento emocional, uma viva excitação religiosa podem levar o indivíduo a pronunciar palavras estranhas ou mesmo de outro idioma (percebido em conversas de colegas, de companheiros de viagem, de amigos estrangeiros...). Isto acontece ainda mais facilmente se o fiel está sugestionado e acredita que vai receber o dom das línguas associado ao "Batismo no Espírito Santo". A sugestão move o inconsciente a funcionar mais rápida e generosamente.
Com isto, não queremos negar a possibilidade de uma efusão especial do Espírito Santo, doador de graças, mas desejamos chamar a atenção para o risco de se confundirem fenômenos heterogêneos e dar valor (= autoridade e importância) descabido a manifestações do sujeito, que, sob a capa de inspiração divina, pode estar impondo seu modo de ver pessoal.
5. As Doenças
Um dos fatores que mais contribuem para a propagação das correntes pentecostais, são as curas de doenças tidas como milagrosas. A propósito convém apresentar a mentalidade segundo a qual os pentecostais freqüentemente consideram as moléstias. A doença é, muitas vezes, tida como punição... punição do pecado. Eis os depoimentos oriundos dos lábios de crentes pentecostais: "A doença é um castigo de Deus. Embora Ele não envie a doença, permite que o Diabo a envie para o mau crente como castigo, ou, até mesmo, para aquele crente que Deus quer provara sua fé. Assim como Deus abençoa até mil gerações aos que fazem a Sua vontade, Ele também castiga, através do Diabo, até a terceira geração. Por isso os filhos ficam às vezes doentes por causa dos pecados dos pais, ou para glorificação de Deus pela fé" (ob. cit., p. 167).
"A doença vai do pecado, até do pecado original. Se uma pessoa ou seus antepassados conheceram a verdade e depois cometeram mal perante Deus, são castigados por Ele. Deus só castiga aqueles que cre ram e pecaram. Nós estamos aqui para orar em vigília, para não cair e ficar aleijados, para não ter um câncer. Para ir para Cristo, temos de orar todos os dias, com muita fé, para que Jesus nos livre dos ataques do Diabo, que traz as doenças" (ob. cit., p. 168).
Se tal é a origem das doenças, entende-se que a cura há de ser obtida, antes do mais ou talvez até exclusivamente, através da oração. Eis outro testemunho: "Todas as doenças vêm do Diabo, mas podem ser evitadas pelo asseio e pela abstinência. Na vida eterna, não existirão mais doenças e provações. O médico, com a permissão de Deus, pode curar. Quando eu fico doente, oro e peço a Deus para ser curado. Não sendo curado, procuro aumentar minha fé; não conseguindo, apelo para a medicina".
Os crentes mais extremados afirmam envergonhar-se de recorrer ao médico ou tomar remédios, pois "este pode ser um dos meios de que se vale Satanás para enfraquecer nossa fé na cura de Jesus". Um fiel entrevistado concluiu, de modo convicto: "Quem não tem fé, pode ser curado pelo médico. Os crentes novos às vezes são fracos, duvidam da cura. Por isto vão ao médico, mas depois se convencem de que só Deus é quem cura". Eis outro depoimento:
"O crente, quando tem muita fé e crê firmemente em Jesus, não procura médicos. Ele ora para o Senhor, que é o médico dos médicos. Agora, quando o crente não tem fé suficiente, não é capaz de orar com convicção; ele pode procurar a ciência da terra, pode tomar remédio" (ob. cif., p. 143). As pretensas curas obtidas no espiritismo são tidas como "curas enganadoras, de que se vale o diabo para conquistar as almas".
Tendo procurado terreiros de umbanda e sessões espíritas antes de conhecer o Pentecostalismo, um dos informantes, adepto da seita, declara:
"A cura do Espiritismo é a cura do corpo, mas a alma se perde. Satanás também tem o dom de fazer milagres, mas faz para o mal. O demônio é uma criatura desesperada. Faz curas, mas a diferença está em que a pessoa curada pelo Espiritismo não crê em nada, a pessoa não muda porque não crê, continua uma pessoa do mundo. Eu mesmo fui curado pelo Espiritismo, antes de me converter. Fui ao centro espírita, tomei o remédio que mandaram e sarei. O mal, porém, continuou dentro de mim, pois não acreditava em nada. Agora sou diferente porque estou salvo por Jesus" (ob. cit., pp. 169s).
Doenças e Maravilhosas Curas
Muitas pessoas são atraídas pelas correntes religiosas que prometem e "realizam" curas maravilhosas de doenças graves. - Para explicar os portentos assim efetuados, é oportuno lembrar que existem moléstias funcionais devidas a um bloqueio do psiquismo do paciente; tais doenças podem ser, ao menos aparentemente, curadas pelo desbloqueio do enfermo provocado por sugestão ou por impacto; tenham-se em vista os placebo. A Teologia católica reconhece o milagre, mas só o faz após rigoroso exame de cada caso a fim de averiguar se não há explicação natural para o mesmo. Em linguagem católica, quando se diz que "a fé cura", entende-se que a fé predispõe o paciente abrindo-o para a graça; só Deus pode realizar milagres.
Um dos fatores que muita gente atraem ao Pentecostalismo, são as propaladas curas de doenças que a medicina não consegue debelar, ou para tratar das quais o paciente não tem recursos financeiros. De resto a prática da medicina não científica, mas "mística", sempre esteve em voga, constituindo o que se chama "o curandeirismo".
Para entender o fenômeno, é preciso considerar um preliminar importante.
6. Doenças e "doenças"
Toda doença é psicossomática, isto é, afeta o físico (soma) e o psíquico do paciente. Há, porém, doenças mais acentuadamente ligadas ao psíquico (são as doenças ditas "funcionais") e outras mais fortemente ligadas ao físico (são as doenças orgânicas). As doenças funcionais estão muito relacionadas com fatores emotivos, que causam certo bloqueio do sistema nervoso e, conseqüentemente, disfunção ou paralisia de órgãos ou sistemas do organismo.
Tais são certas moléstias da pele (eczema, verrugas, urticária), furunculose, asma, úlcera do estômago, angina do peito, insuficiência hepática, colite, hemorragias... Visto que a causa destas doenças é freqüentemente um bloqueio psíquico, basta eliminar esse bloqueio pela sugestão, pela transmissão de otimismo e confiança, para que a moléstia desapareça.
As doenças orgânicas são as que decorrem de uma lesão ou agressão ao físico: o câncer, a cegueira por perda do nervo ótico, as fraturas... Estas não dependem tanto de sugestão; por isto não são curadas por vias "místicas", ao passo que as primeiras o podem ser. Além disto, observemos que há doenças ilusórias... Certas pessoas de boa fé apresentam todos os sintomas de doenças funcionais ou mesmo orgânicas. Na verdade, porém, não sofrem senão dos efeitos de sua sugestionabilidade. Em tais casos, o curandeiro pode produzir "curas maravilhosas".
Há também doenças mal diagnosticadas tidas como graves, quando na verdade não o são. Após a cura, proclama-se a ocorrência de milagre, quando na realidade não o houve. Feita esta observação preliminar, passamos a estudar as diversas modalidades da medicina não científica.
7. As curas do Pentecostalismo
a) Se alguém vai a uma igreja acreditando que o demônio lhe está causando tal ou tal enfermidade, é submetido a um "exorcismo" e recebe a bênção do pastor. Em conseqüência, passa a se sentir bem ou curado. Ora nesses casos pode-se dizer que, de modo geral, não há mais do que psicoterapia baseada na sugestão: auto-sugestão, hétero-sugestão, sugestão coletiva do ambiente, sugestão hipnótica, contágio mental. O pastor e a assembléia aplicam ao paciente gestos e ritos que o desbloqueiam; se o doente acredita que esses gestos e ritos têm poder de curar, ele há de se sentir aliviado ou pretensamente curado.
É conhecido o funcionamento dos placebo (= agradarei). São remédios aparentes, inoperantes, que produzem efeito benéfico, porque excitam a sugestão positiva do paciente. Sim, a psicologia ensina que um órgão humano pode entrar em atividade tanto sob influência de seus excitantes naturais (remédios adequados) como sob a excitação de estimulantes que são meramente convencionais. Por conseguinte, caso se diga a alguém que determinado objeto ou determinada fórmula ou determinado tratamento é benéfico para o corpo, pode acontecer que, embora tais objetos ou fórmulas... sejam de todo indiferentes e inoperantes, a pessoa que, impressionada ou sugestionada, os aplique a si, experimente um benefício corpóreo. Tal "estímulo-sinal" terá produzido verdadeira reação biológica favorável à cura, por causa da confiança e da convicção do paciente; será oportuno até para recolocar em atividade um órgão paralisado do organismo do paciente.
Estas reações, ditas "reflexos condicionados", elucidam a eficácia atribuída a certos processos da "medicina" supersticiosa: trata-se de agentes inócuos em si, mas transformados em fatores benéficos por causa da convicção que o paciente, após haver sido (consciente ou inconscientemente) doutrinado, nutre a respeito de sua "eficácia".
Em conseqüência, vê-se que não há dificuldade em admitir o bom êxito da seguinte receita dos curandeiros: quem queira curar-se de verrugas, procure um osso no campo, friccione a verruga com a parte do osso que estava voltada para o chão, coloque de novo o osso no lugar e vá-se embora às carreiras... O tratamento pode dar resultado, pois afirmam os médicos que a verruga pode ser combatida pela sugestão (cf. Dr. A. da Silva Mello, Mistérios e Realidades deste e do outro Mundo. Rio 1950, 421).
b) Pergunta-se, porém: se a ação do curandeiro cura por sugestão, por que a ação do médico não tem a mesma força sugestionante? Na verdade, há pacientes que passam pelos médicos sem obter resultados, mas sob os cuidados do curandeirismo se dizem sanados.
A resposta não é difícil: a ação do médico é freqüentemente muito objetiva; ele não trata o doente, mas a doença. Ao contrário, a ação do curandeiro é essencialmente subjetiva; ela se exerce sobre o doente, e não sobre a doença. Diante do médico, o doente toma uma atitude tímida e fechada, pois a superioridade fria do médico o assusta. Ao invés, entre o curandeiro e seu cliente há um relacionamento de intensa afetividade: "ele é o grande homem, o milagreiro que já curou tantos, o único que ainda poderá salvar o paciente!".
Levemos em conta a aura de mistério que cerca o curandeiro benfazejo: o próprio local de atendimento onde reina concentração anormal ou o frenesi coletivo de uma massa fanatizada; as conversas sobre casos maravilhosos já ocorridos e que os clientes vão recordando durante o tempo de longa espera do seu atendimento; os meios mirabolantes dos passes, dos toques, das insuflações ou os berros e as exclamações daqueles que "esconjuram o demônio", e daqueles dos quais saem os maus espíritos; a ânsia de recuperar a saúde, custe o que custar... Isto tudo contribui para suscitar no paciente a mais inabalável certeza de que será curado, se se entregar sem resistência à ação do curandeiro (ou do pastor "exorcista"). Se a doença não for orgânica (como parece que, de fato, não é em 83% dos casos), o curandeiro conseguirá resultados que o médico seria incapaz de obter.
Também é de notar que freqüentemente os médicos dizem ao hipocondríaco que ele não tem doença, mas imagina tê-la. Muitos pacientes, com isto, sentem-se incompreendidos e ofendidos. O curandeiro, porém, já pelo fato de ter pouca instrução, não fala assim. Em vez de negar a doença, promete ao cliente que será curado ou já está curado. Ora a psicologia reconhece que o procedimento do curandeiro é mais eficaz do que o do médico, no caso.
c) Em conseqüência, impõe-se uma observação: não se deve dar fácil crédito à proclamação de fenômenos portentosos (especialmente curas médicas e cirúrgicas), mas, antes de procurar-lhes a explicação, é necessário investigar exatamente se houve algum fato extraordinário e em que consistiu propriamente. Portanto a quem anuncia uma cura, é preciso pedir:
1) uma declaração médica a respeito da doença ou do estado de saúde da pessoa em foco antes de passar pelo "tratamento".
2) uma declaração médica atestando a cura total e duradoura da moléstia por via inexplicável aos olhos da ciência. Sem estes atestados, poderíamos estar procurando as causas de milagres que nunca houve, embora o paciente se diga curado. Quem deve dizer se houve realmente cura, é o médico, após fazer os devidos exames científicos. A seriedade e honestidade científica é imprescindível em tais casos.
A explicação dada atrás vale para as doenças funcionais, não para as doenças orgânicas ou para as doenças que dependem não de lesão física, mas de perturbação do sistema nervoso. As doenças funcionais ou nervosas ou mesmo as doenças orgânicas de origem nitidamente psíquica ou nervosa não vêm ao caso, quando se trata de milagre na apologética ou na teologia. Ao contrário, interessam as lesões orgânicas nitidamente diagnosticadas e tidas como incuráveis pela medicina contemporânea. Caso sejam curadas em um contexto de fé e prece puras, pode-se admitir aí uma intervenção extraordinária de Deus ou um milagre.
Verifica-se, porém, que nas comunidades pentecostais não se realiza o exame médico-científico do paciente antes da cura e depois da cura, para saber se houve, de fato, a eliminação radical do mal ou apenas um paliativo. Os dirigentes e os fiéis aclamam "o milagre", que geralmente é ilusório, se se trata de doença orgânica. Um dos grandes inconvenientes do curandeirismo consiste em fazer que o enfermo acredite estar salvo de moléstia, quando, na verdade, esta permanece incubada; por causa do alívio momentâneo, o paciente deixa de se tratar; entrementes o mal progride em seu organismo de tal modo que, quando o paciente dá por ele, já se encontra muito mais atacado do que antes de pretensa cura.
8. Circunstâncias que abonam ou desabonam
Todo milagre é um sinal ou uma palavra de Deus aos homens. Ora, para que essa palavra possa ser reconhecida e utilizada como testemunho válido para todos os homens, é necessário que ela tenha certas características. Estas podem ser negativas e positivas.
8.1. Critérios negativos
Não são reconhecidos como milagres fenômenos realizados em contexto indigno de Deus:
a) Tais seriam, em primeiro lugar, os ambientes de irreverência a Deus, imoralidade ou deboche de costumes, charlatanismo ou ilusionismo, cobiça de lucros materiais ou aceitação de lucro financeiro por parte do pretenso taumaturgo, ocasião de satisfazer ao orgulho, à vaidade ou à sensualidade das pessoas envolvidas no portento... O Senhor Deus não pode ser incoerente ou contraditório; Ele não realiza sinais ou palavras portentosas que de algum modo possam sugerir a confirmação do deboche, da fraude ou da imoralidade...
b) Ambientes de sensacionalismo e alarde levam igualmente a desconfiar da autenticidade do "milagre". - Na verdade, as obras de Deus costumam ser discretas, mesmo quando derrogam ao curso natural dos acontecimentos. Um portento exageradamente sensacional já não seria sinal, pois não levaria os espectadores a procurar outra realidade invisível assim assinalada. Alimentaria a fantasia e a curiosidade profanas mais do que a inteligência, a fé e a reverência a Deus.
c) O espírito de arrogância e de domínio com que alguém trate as coisas de Deus e os fenômenos prodigiosos, também resulta em desabono do pretenso milagre. Quem julga ter direito a algum milagre, porque possui ciência e receitas ou porque é virtuoso e sempre foi fiel a Deus, já se coloca fora das disposições necessárias para ser atendido pelo Senhor Deus. O autêntico milagre é sempre sinal gratuito, nunca é devido por Deus ao homem. O homem não "encomenda" milagres a Deus. Somente quando assume uma atitude de humildade e disponibilidade, pode o homem esperar receber a graça e a condescendência de Deus.
8.2. Critérios positivos
Uma vez enunciadas as características que, no sentido teológico e apologético, desabonam o milagre, importa averiguar as que o recomendam e autenticam aos olhos do observador. Para que uma cura de enfermidade venha a ser levada em conta como possível resposta de Deus aos homens, deve, segundo a jurisprudência da Igreja, preencher as cinco seguintes condições:
1) Trate-se de uma doença orgânica grave, consistindo em alterações anatômicas (modificação, perda ou hiperprodução de tecidos...). Essa doença terá sido diagnosticada pelos métodos mais seguros e haverá sido considerada totalmente incurável aos olhos da medicina contemporânea.
2) Tenham sido ineficientes todos os meios terapêuticos devidamente aplicados.
3) Verifique-se a restauração dos órgãos ou tecidos lesados em espaço de tempo tão breve que possa ser considerado instantâneo.
4) Não se tenha registrado o prazo ordinariamente necessário para a recuperação gradual da função lesada (a pessoa curada conseguiu logo caminhar ou comer e digerir com toda a normalidade...). Ou, em outros casos, não se tenha verificado o prazo necessário para a reabsorção dos edemas, dos derrames de pleura ou para a destruição das massas de tumores - o que não exclui ritmo progressivo (mas rápido) do estado geral de saúde da pessoa curada (aumento de peso, de forças, etc.).
5) Seja a cura duradoura, capaz de ser comprovada por exames sucessivos, feitos a intervalos regulares durante longo espaço de tempo. É importante frisar que o quadro mais normal dentro do qual o milagre se insere, é o da prece humilde, destituída de crendices ou artifícios supersticiosos. O prodígio aparece então como a resposta de Deus ao apelo da miséria do homem. Este não é capaz de comprar ou de forçar o favor de Deus; não há preces ou ritos de efeito infalível; a oração agradável a Deus é a que procede de um coração filial, voltado para o Pai do céu em confiança e amor, sem "receitas" prévias "garantidas".
9. A fé que salva
A expressão "a tua fé te salvou", freqüente nos lábios de Jesus (cf. Mt 8, 13; 9, 2.22.15, 28; 17, 20), não quer dizer que os milagres sejam projeções do psiquismo subjetivo do paciente (faith healing, Ia foi qui guérit). Há, sem dúvida, casos de cura por auto-sugestão; tenham-se em vista as moléstias funcionais que são criadas e extintas por sugestão do próprio paciente.
A fé, de resto, não é sugestão subjetiva. A fé que Jesus louva nos Evangelhos como penhor de salvação, significa abertura para Deus cheia de entrega e confiança. Está claro que uma tal disposição acalma o sis tema nervoso do paciente, mas é incapaz de explicar a cura radical do mesmo, quando afetado de certas lesões orgânicas. A autêntica fé, ademais, é precedida por um juízo da razão; longe de ser cega ou sentimental, ela supõe o conhecimento dos motivos de credibilidade: por que posso crer?... por que crer precisamente em Jesus de Nazaré?... por que crer na Igreja Católica, e não em outra comunidade religiosa? O estudo de tais perguntas exige o funcionamento da razão e da lógica, contribuindo assim para emancipar da sugestão, do sentimentalismo e do fanatismo a autêntica fé cristã.
De resto, a fé não dispensa o homem de servir-se dos recursos que Deus lhe dispensa para livrar-se de seus males. Se Deus deu ao homem inteligência, não pode deixar de querer que o ser humano a utilize para atingir seus fins legítimos. Omitir-se neste setor, esperando que Deus faça milagrosamente o que o homem pode fazer inteligentemente, é tentar a Deus; é falsa devoção. A S. Escritura mesma elogia o médico e recomenda o recurso ao médico, ao mesmo tempo que reconhece que Deus é a fonte de todo o saber e de toda a perícia do médico; veja-se Eclo 38, 1-12:
"Rende ao médico as honras que lhe são devidas, por causa de seus serviços, porque o Senhor o criou. Pois é do Altíssimo que vem a cura, como um presente que se recebe do rei. A ciência do médico o faz trazer a fronte erguida, ele é admirado pelos grandes... O Senhor é que deu a ciência aos homens, a fim de que se gloriem com suas obras poderosas. Por eles, Ele curou e aliviou, o farmacêutico fez com eles misturas... e por ele a saúde se difunde sobre a terra.
Filho, não te revoltes na tua doença, mas reza ao Senhor, e Ele te curará... Dá lugar ao médico, porque o Senhor também o criou; não o afastes de ti, porque dele tens necessidade. Há ocasião em que a saúde está entre suas mãos". Sobre o milagre e seu autêntico significado, ver outrossim nosso Curso sobre Ocultismo, Módulos 5, 6 e 21. {Pergunte e Responderemos - abril de 2003}
Remetido por José Augusto
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