Blog Alma Missionária

Blog Alma Missionaria

quinta-feira, 30 de maio de 2013

Apologetica
A Inquisição espanhola

Autor: D. Estevão Bitencour
Fonte: Site Cleofas
A Inquisição Espanhola
D. Estevão Bettencourt, osb
Já estudamos a lnquisição Medieval nos capítulos 33 e 34.Passamos à Inquisição Espanhola, que teve suas características próprias.
Origem da lnquisição Espanhola
Os reis Fernando e Isabel, visando a plena unificação de seus domínios, tinham consciência de que existia uma instituição eclesiástica, a lnquisição ´ oriunda na ldade Média com o fim de reprimir um perigo religioso e civil dos séculos XI/XII (a heresia cátara ou albigense); a este perigo pareciam assemelhar´se as atividades dos marranos (judeus) e mouriscos (árabes) na Espanha do século XV.
1) A lnquisição Medieval, que nunca fora muito ativa na península ibérica, achava´se a mais ou menos adormecida na segunda metade do séc. XV Aconteceu, porém, que durante a Semana Santa de 1478 foi descoberta em Sevilha uma conspiração de marranos, a qual muito exasperou o público. Então lembrou´se o rei Fernando de pedir ao Papa, reavivasse na Espanha a antiga Inquisição, e a reavivasse sobre novas bases, mais promissoras para o reino, confiando sua orientação ao monarca espanhol. Sixto IV, assim solicitado, resolveu finalmente atender ao pedido de Fernando (ao qual, depois de hesitar algum tempo, se associara Isabel). Enviou, pois, aos reis da Espanha o Breve de 19 de novembro de 1478, pelo qual “conferia plenos poderes a Fernando e Isabel para nomearem dois ou três lnquisidores, arcebispos, bispos ou outros dignitários eclesiásticos, recomendáveis por sua prudência e suas virtudes, sacerdotes seculares ou regulares, de quarenta anos de idade ao menos, e de costumes irrepreensíveis, mestres ou bacharéis em Teologia, doutores ou licenciados em Direito Canônico, os quais deveriam passar de maneira satisfatória por um exame especial. Tais lnquisidores ficariam encarregados de proceder contra os judeus batizados reincidentes no judaísmo e contra todos os demais culpados de apostasia. o Papa delegava a esses oficiais eclesiásticos a jurisdição necessária para instaurar os processos dos acusados conforme o Direito e o costume; além disto, autorizava os soberanos espanhóis a destituir tais Inquisidores e nomear outros em seu lugar, caso isto fosse oportuno” (L.Pastor, Histoire des Papes IV 370). Note´se bem que, conforme este edito, a lnquisição só estenderia sua ação a cristãos batizados, não a judeus que jamais houvessem pertencido a lgreja; a instituição era, pois, concebida como órgão promotor de disciplina entre os filhos da Igreja, não como instrumento de intolerância em relação às crenças não´cristãs.
Procedimentos da Inquisição
Apoiados na Iicença pontifícia, os reis da Espanha aos 17 de setembro de 1480 nomearam lnquisidores, com sede em Sevilha, os dois dominicanos Miguel Morillo e Juan Martins, dando´lhes como assessores dois sacerdotes seculares. os monarcas.promulgaram também um compêndio de “Instruções”, enviado a todos os tribunais da Espanha, constituindo como que um código da Inquisição, a qual assim se tornava uma espécie de órgão do Estado civil. Os Inquisidores entraram logo em ação, procedendo geralmente com grande energia. Parecia que a lnquisição estava a serviço não da Religião propriamente, mas dos soberanos espanhóis, os quais procuravam atingir criminosos mesmo de categoria meramente política. Em breve, porém, fizeram´se ouvir em Roma queixas diversas contra a severidade dos Inquisidores. Sixto IV então escreveu sucessivas cartas aos monarcas da Espanha, mostrando´lhes profundo descontentamento por quanto acontecia em seu reino e baixando instruções de moderação para os juízes tanto civis como eclesiásticos. Merece especial destaque neste particular o Breve de 2 de agosto de 1482, que é o Papa, depois de promulgar certas regras coibitivas do poder dos Inquisidores, concluia com as seguintes palavras: “Visto que somente a caridade nos toma semelhantes a Deus. rogamos e exortamos o Rei e a Rainha, pelo amor de Nosso Senhor Jesus Cristo, a fim de que imitem Aquele de quem é caracteristico ter sempre compaixão e perdão. Queiram, portanto, mostrar´se indulgentes para com os seus súditos da cidade e da diocese de Sevilha que confessam o erro e imploram a misericórdia!” Contudo, apesar das freqüêntes admoestações pontifícias, a Inquisição Espanhola ia´se tornando mais e mais um órgão poderoso de influência e atividade do monarca nacional. Para comprovar isto, basta lembrar o seguinte: a Inquisição no território espanhol ficou sendo instituto permanente durante três séculos a fio. Nisto diferia bem da Inquisição Medieval, a qual foi sempre intermitente, tendo em vista determinados erros oriundos em tal e tal localidade. A manutenção permanente de um tribunal inquisitório impunha avultadas despesas, que somente o Estado podia tomar a seu cargo; foi o que se deu na Espanha: os reis atribuiam a si todas as rendas materiais da lnquisição (impostos, multas, bens confiscados) e pagavam as respectivas despesas; conseqüentemente alguns historiadores, referindo´se à Inquisição Espanhola, denominaram´na “Inquisição Régia!”
Emancipada de Roma
A fim de completar o quadro até aqui traçado, passemos a mais um pormenor característico do mesmo. Os reis Fernando e Isabel visavam a corroborar a Inquisição, emancipando´a do controle mesmo de Roma... Conceberam então a idéia de dar à instituição um chefe único e ´plenipotenciário ´ o lnquisidor´Mor ´, o qual julgaria na Espanha mesma os apelos dirigidos a Roma. Para este cargo, propuseram à Santa Sé um religioso dominicano, Tomás de Torquemada (“a Turrecremata”, em latim), o qual em outubro de 1483 foi realmente nomeado Inquisidor´Mor para todos os territórios de Fernando e Isabel. Procedendo à nomeação escrevia o Papa Sixto IV a Torquemada: “Os nossos carissimos filhos em Cristo, o rei e a rainha de Castela e Leão, nos suplicaram para que te designássemos como Inquisidor do mal da heresia nos seus reinos de Aragão e Valença, assim como no principado de Catalunha” (Bullar.ord. Praedicatorum /// 622). O gesto de Sixto IV só se pode explicar por boa fé e confiança. O ato era, na verdade, pouco prudente... Com efeito; a concessão benignamente feita aos monarcas seria pretexto para novos e novos avanços destes: os sucessores de Torquemada no cargo de Inquisidor´Mor já não foram nomeados pelo Papa, mas pelos soberanos espanhóis (de acordo com critérios nem sempre louváveis). Para Torquemada e sucessores, foi obtido da Santa Sé o direito de nomearem os lnquisidores regionais, subordinados ao lnquisidor´Mor. Mais ainda: Fernando e Isabel criaram o chamado “Conselho Régio da Inquisição”, comissão de consultores nomeados pelo poder civil e destinados como que a controlar os processos da Inquisição; gozavam de voto deliberativo em questões de Direito civil, e de voto consultivo em temas de Direito Canônico. Uma das expressões mais típicas da autonomia arrogante do Santo ofício espanhol é o famoso processo que os Inquisidores moveram contra o arcebispo primaz da Espanha, Bartolomeu Carranza, de Toledo. Sem descer aos pormenores do acontecimento, notaremos aqui apenas que durante dezoito anos contínuos a Inquisição Espanhola perseguiu o venerável prelado, opondo´se a legados papais, ao Concílio Ecumênico de Trento e ao próprio Papa, em meados do séc. XVI. Frisando ainda um particular, lembraremos que o rei Carlos III (1759´1788) constituiu outra figura significativa do absolutismo régio no setor que vimos estudando. Colocou´se peremptoriamente entre a Santa Sé e a Inquisição, proibindo a esta que executasse alguma ordem de Roma sem licença prévia do Conselho de Castela, ainda que se tratasse apenas de proscrição de livros. O lnquisidor´Mor, tendo acolhido um processo sem permissão do rei, foi logo banido para localidade situada a doze horas de Madrid; só conseguiu voltar após apresentar desculpas ao rei, que as aceitou, declarando:
“O Inquisidor Geral pediu´me perdão, e eu Iho concedo,´ aceito agora os agradecimentos do tribunal,´ protegê´lo´ei sempre, mas não se esqueça desta ameaça de minha cólera voltada contra qualquer tentativa de desobediência” (cf. Desdevises du Dezart, L’Espagne de I’Ancien Regime. La Société 101s). A história atesta outrossim como a Santa Sé repetidamente decretou medidas que visavam a defender os acusados frente à dureza do poder régio e do povo. A Igreja em tais casos distanciava´se nitidamente da lnquisição Régia, embora esta continuasse a ser tida como tribunal eclesiástico. Assim aos 2 de dezembro de 1530, Clemente VII conferiu aos lnquisidores a faculdade de absolver sacramentalmente os delitos de heresia e apostasia; destarte o Sacerdote poderia tentar subtrair do processo público e da infâmia da Inquisição qualquer acusado que estivesse animado de sinceras disposições para o bem. Aos 15 de junho de 1531, o mesmo Papa Clemente VII mandava aos Inquisidores tomassem a defesa dos mouriscos que, ´ocabrunhados de impostos pelos respectivos senhores e patrões, poderiam conceber ódio contra o Cristianismo. Aos 2 de agosto de 1546, Paulo III declarava os mouriscos de Granada aptos para todos os cargos civis e todas as dignidades eclesiasticas. Aos 18 de janeiro de 1556, Paulo IV autorizava os sacerdotes a absolver em confissão sacramental os mouriscos. Compreende´se que a Inquisição Espanhola, mais e mais desvirtuada pelos interesses às vezes mesquinhos dos soberanos temporais, não podia deixar de cair em declínão. Foi o que se deu realmente nos séculos XVIII e XIX. Em conseqüência de uma revolução, o Imperador Napoleão I interveio no governo da nação, aboliu a Inquisição Espanhola por decreto de 4 de dezembro de 1808. o rei Fernando VII, porém, restaurou´a em 1814, a fim de punir alguns de seus súditos que haviam colaborado com o regime de Napoleão. Finalmente, quando o povo se emancipou do absolutismo de Fernando VIl, restabelecendo o regime liberal no país, um dos primeiros atos das Cortes de Cadiz foi a extinção definitiva da Inquisição em 1820. A medida era, sem dúvida, mais do que oportuna, pois punha termo a uma situação humilhante para a Sta. Igreja.
Tomás de Torquemada



Tomás de Torquemada nasceu em Valladolid (ou, segundo outros, em Torquemada) no ano de 1420 Fez´se Religioso dominicano, exercendo por 22 anos o cargo de Prior do convento de Santa´Cruz em Segóvia. Já aos 11 de fevereiro de 1482 foi designado por Sixto IV para moderar o zelo dos lnquisidores espanhóis. No ano seguinte o mesmo Pontífice o nomeou Primeiro Inquisidor de todos os territórios de Fernando e Isabel. Extremamente austero para consigo mesmo, o frade dominicano usou de semeIhante severidade nos seus procedimentos judiciários. Dividiu a Espanha em quatro setores inquisitoriais, que tinham como sedes respectivas as cidades de Sevilha, Córdova, Jaen e Villa (Ciudad) Real. Em 1484 redigiu, para uso dos lnquisidores, uma “Instrução”, opúsculo que propunha normas para os processos inquisitoriais, inspirando´se em tramites já usuais na Idade Média; esse libelo foi completado por dois outros do mesmo autor, que vieram a lume respectivamente em 1490 e 1498. O rigor de Torquemada foi levado ao conhecimento da Sé de Roma; o Papa Alexandre VI, como dizem algumas fontes históricas, pensou então em destitui´lo de suas funções; só não o terá feito por deferência a corte da Espanha. O fato é que o Pontífice houve por bem diminuir os poderes de Torquemada, colocando a seu lado quatro assessores munidos de iguais faculdades (Breve de 23 de junho de 1494). Quanto ao número de vítimas ocasionadas pelas sentenças de Torquemada, as cifras referidas pelos cronistas são tão pouco coerentes entre si que nada se pode afirmar de preciso sobre o assunto. Tomás de Torquemada ficou sendo, para muitos, a personificação da intolerância religiosa, homem de mãos sangüinolentas...Os historiadores modernos, porém, reconhecem exagero nessa maneira de conceituá´lo; levando em conta o caráter pessoal de Torquemada, julgam que este Religioso foi movido por sincero amor é verdadeira fé, cuja integridade lhe parecia comprometida pelos falsos cristãos; daí o zelo extraordinário com que procedeu. A reta intenção de Torquemada ter´se´á traduzido de maneira pouco feliz. De resto, o seguinte episódio contribui para desvendar outro traço, menos conhecido, do frade dominicano: em dada ocasião, foi levada ao Conselho Régio da Inquisição a proposta de se impor aos muçulmanos ou a conversão ao Cristianismo ou o exilio. Torquemada opôs´se a essa medida, pois queria conservar o clássico princípio de que a conversão ao Cristianismo não pode ser extorquida pela violência; por conseguinte, a Inquisição deveria restringir sua ação aos cristãos apóstatas; estes, e somente estes, em virtude do seu Batismo, tinham um compromisso com a Igreja Católica. Como se vê Torquemada, no fervor mesmo do seu zelo, não perdeu o bom senso neste ponto. Exerceu suas funções até a morte, aos 16/09/1498.
A Verdade sobre a Inquisição Espanhola
(Carta a mr. Isaacs, judeu-maçom)

Fonte: Site Agnus Dei
Autor: David Goldstein (ex-judeu)
Transmissão: Gercione Lima

Um estudioso a respeito de preconceito disse uma certa vez:

"A mente humana é como uma folha de papel em branco sobre a qual as impressões que permanecem por mais tempo gravadas são aquelas em negro".

A verdade desta observação nunca foi tão aparente como quando consideramos os judeus e a Inquisição Espanhola... Se os ensinamentos do Antigo Testamento fossem gravados nas mentes e corações dos judeus da mesma forma como eles fazem questão de recalcar continuamente suas histórias de calamidades e perseguições, certamente os rabinos não teriam que se lamentar tanto pelo desinteresse em religião por parte das crianças judias, como eles fizeram na conferência de Atlantic City. Livro após livros judeus, revistas de circulação semanal e mensal incessantemente fazem questão de citar a Inquisição Espanhola, de forma que, como disse Maurice Fueurlich na revista Forum (setembro de 1937), "isto se tornou um complexo de perseguição para os judeus". Em seu livro intitulado "Filhos de Uma Raça Mártir", este escritor disse "que a Inquisição espanhola foi enfiada em minha consciência de uma forma tão profunda que se tornou um elemento básico em toda a minha vida emocional".
A versão judaica para a Inquisição Espanhola que aconteceu há 450 anos atrás, é a fonte da qual emanou muito do medo dos judeus pela Igreja Católica, e muita hostilidade contra os judeus que se converteram ao Catolicismo. Isto é verdade até mesmo entre os rabinos que buscam uma união de forças com os Sacerdotes Católicos contra muitas das injustiças de nosso tempo e que afligem tanto judeus como Católicos. Eles sustentam que enquanto a Cristandade estiver dividida, enquanto os Católicos forem minoria, não há o que temer. Mas se a Igreja Católica tivesse que se tornar novamente a única Igreja Cristã, como ela sempre foi até a Idade Média, então, "tomem cuidado com o Auto-de-Fé!". O Auto-de-Fé era uma solene cerimônia religiosa que os mal informados e os detratores fazem questão de sustentar como um lugar de torturas ou execuções na fogueira.

Todos aqueles que no Judaísmo falam ou escrevem sobre a Inquisição Espanhola, com raríssimas exceções, na verdade receberam suas informações de fontes preconceituosas ou de pessoas cujos dados à respeito do assunto foram tiradas de fontes envenenadas de informação, e isto serve também para muitos daqueles que me perguntam: "Como pode você se juntar a uma Igreja que infligiu tantas crueldades contra seu próprio povo durante a Inquisição Espanhola?".
Pois, eu digo que tal pergunta poderia simplesmente ser descartada com a simples declaração de que a minha caminhada para a pia batismal da Igreja Católica foi condicionada pela minha crença em seus princípios e não por qualquer concordância com qualquer coisa que tenha sido praticada por católicos durante a Inquisição Espanhola ou outro período qualquer da história. Mas a importância desta pergunta, considerando que a Inquisição Espanhola é o entrave que fecha toda a tentativa de diálogo entre judeus e católicos, força-me a lidar com este assunto com uma certa profundidade e evitando certos equívocos.
- Para entender adequadamente esta questão, é necessário que tenhamos em mente o fato de que a Inquisição é uma Corte de Inquérito, e que todas as sociedades, inclusive a Loja maçônica à qual você pertence, possuem cortes de julgamentos temporárias ou permanentes, sob diferentes nomes, para examinar aqueles membros acusados de violarem seus princípios. Em tais sociedades, caso sejam julgados culpados, tais membros são punidos, não por penas como: "terem suas gargantas cortadas, suas línguas arrancadas pela raiz e seus corpos enterrados nas areias do mar", como você solenemente jurou permitir à sua loja de fazê-lo quando você se tornou um mestre maçônico, caso viesse a revelar os seus segredos. Ora, se as sociedades seculares podem legitimar instituições como Cortes e Tribunais e impor sentenças, porque então não poderia a Igreja Católica, por um motivo muito maior, instituir uma Corte de Inquisição, considerando que violar seus sagrados princípios é o mesmo que violar os princípios de Deus, transmitidos à humanidade através de Moisés e de Jesus Cristo, o Messias?
- Para melhor entender esta questão, é necessário ter em mente o fato de que a Inquisição foi instituída na Espanha para pessoas que professavam serem católicas e não para judeus praticantes. A Inquisição era para desmascarar e levar à penitência, não apenas os heréticos, como muitos judeus acreditam, mas também bígamos, adúlteros, blasfemadores e outros transgressores dos princípios da Santa Igreja à qual eles, como homens e mulheres batizados, eram obrigados a obedecer e serem fiéis. George Sokolsky, um editor de Nova Iorque, declarou no artigo intitulado: "Nós, Judeus":

"A tarefa da Inquisição não era perseguir judeus, mas limpar a Igreja de todo traço de heresia ou qualquer coisa não ortodoxa. A Inquisição não estava preocupada com os infiéis fora da Santa Igreja, mas com aqueles heréticos que estavam dentro dela" (Nova Iorque, 1935, p. 53).

A Inquisição Espanhola foi instituída para desmascarar e expulsar aqueles judeus e muçulmanos batizados que fingiam serem católicos sinceros e praticantes, enquanto secretamente aderiam às práticas do Islamismo e do Judaísmo, o que é um ato sacrílego bem mais grave. Eles eram também inimigos do Estado, visto que a Espanha era cristã em seus princípios e carregava o estandarte da Cruz na batalha contra o "crescente islâmico". Como posterior evidência, consideremos o que Dr. Salo Wittmayer Baron, um dos maiores historiadores americanos na História do Judaísmo, tem a dizer sobre este assunto:
"Parece ser tanto fato quanto teoria que os judeus que nunca deixaram de professar o judaísmo, foram deixados em seu todo, completamente livres dos atos da Santa Inquisição, desde o seu estabelecimento em 1478 até a expulsão dos judeus da Espanha. Na verdade, ouvimos falar de apenas uma persguição dirigida contra a comunidade judaica, quando os judeus de Huesca foram acusados, em 1489, de terem admitido conversos 'pseudos convertidos do Judaísmo para o Cristianismo' de volta ao rebanho judaico. Foi precisamente a inabilidade das Cortes de Inquisição em checar a influência judaica sobre os conversos que serviu de argumento decisivo para os Monarcas Católicos banirem de vez os judeus da Espanha".
- Para entender adequadamente esta questão, é necessário recordar o fato de que a Espanha esteve, por mais de metade de 12 (doze) séculos, em guerra contra os muçulmanos, com os quais os judeus se haviam aliado contra os espanhóis. Era a batalha do estandarte da Cruz contra o 'crescente islâmico'. Isto é confirmado pela 'Graetz's History of the Jewish Encyclopedia', a 'Encyclopedia of Jewish Knowledge", a 'Vallentine's Jewish Encyclopedia', e outras autoridades de grande importância no Judaísmo. Os dois últimos claramente dizem: 'Os judeus espanhóis deram boas vindas, ou melhor dizendo, convidaram a invasão árabe. Debaixo do califado (governador muçulmano) do Oeste, com sua capital em Córdoba, seus membros (os judeus) cresceram e atrairam grande influência no Estado' (Dr Cecil Roth, in Vallentine's J. E., p. 612).
É também confirmado que os 'judeus africanos ajudaram os árabes em Córdoba, Málaga, Granada, Sevilha e Toledo, e essas cidades foram colocadas sob controle judaico por tais conquistadores' (Enc. J. Knowledge, pag. 531).

- Para entender adequadamente esta questão, é necessário ter em mente o fato de que, no que toca aos abusos da Inquisição, a Igreja Católica não é mais responsável por eles do que ela é pelas touradas às quais ela sempre condenou. Tais abusos foram cometidos, com poucas excessões, pelo poder civil, e eles foram condenados pelos papas Leão X, Paulo III, Paulo IX e Xisto IX, que reinaram durante aquele período da História. Com certeza, isto é uma grande novidade para você, da mesma forma que o é para a maioria dos judeus, que foram alimentados com histórias sobre o "Auto-de-Fé" que estão longe de serem verdadeiras como as histórias sobre judeus degolando criancinhas cristãs para usar seu sangue em rituais.
- Para entendermos melhor esta questão, convém não se deve esquecer que os papas eram protetores dos judeus, e não seus inimigos. Roma era um porto de refúgio para os judeus perseguidos quando a Cidade Eterna era governada pelos papas, e para ali acorriam muitos judeus imigrados da Espanha. Você nem precisa levar em conta as minhas palavras no que diz respeito à amizade dos papas. Mas, veja o que confirma Dr. Cecil Roth, de Londres, especialista em História do Judaismo. Ele declarou num forum sionista em Búfalo, Estados Unidos:

"Apenas em Roma existe uma colônia de judeus que continuou a sua existência desde bem antes da Era Cristã, isto porque de todas as dinastias da Europa, o Papado não apenas recusou-se a perseguir os judeus de Roma e da Itália, mas também durante todos os períodos, os papas sempre foram protetores dos judeus.
Alguns judeus têm esse sentimento de que o papado possui uma política de perseguição contra os judeus; mas deve-se lembrar que a história inglesa é definitivamente anti-católica, e suas visões do Catolicismo podem muito bem terem sido tingidas por esse anti-catolicismo inglês. Creio que nós, judeus, que somos vítimas de tantos preconceitos, deveríamos livrar nossas mentes de preconceitos e aprendermos dos fatos. A verdade é que os papas e a Igreja Católica, desde os primeiros tempos da Santa Igreja, nunca foram responsáveis por perseguições físicas aos judeus e, entre todas as capitais do mundo, Roma é o único lugar isento de ter sido cenário para a tragédia judaica. E por isso nós, judeus, deveríamos ter gratidão" (25 de fevereiro de 1927).

- Para entender melhor esta questão, convém lembrar o fato de que muitos e muitos séculos antes da Igreja Católica vir a existir, a Assembléia Judaica condenava à morte os transgressores da Lei Mosaica, por infrações que eram bem menos sérias do que as ofensas das quais os judeus eram culpados na Espanha. E isto era ordenado pelos sacerdotes do Judaismo, ao passo que as extremas penas durante os dias da Inquisição Espanhola eram impostas pelo Estado, já que a heresia era considerada um crime pelo Estado naqueles dias. Que aqueles abusos aconteceram por parte dos inquisidores, não podemos negar. A Igreja Católica, embora divinamente protegida de erros, ao definir matérias de fé e de moral, nunca se declarou imune aos atos de abusos de poder da parte de alguns de seus filhos, mesmo daqueles em alta posição de poder. Tais abusos da parte de oficiais da Santa Igreja, fez com que o Papa Leão X excomungasse o Tribunal Católico de Toledo, e que suas testemunhas aparecessem diante de um Tribunal Inquisitorial, sendo condenadas por perjúrio. E isto se deu durante os dias da Inquisição Espanhola. Mas tais casos de abusos de poder eram raros, já que o espírito de caridade dominava esses interrogatórios históricos no que diz respeito à heresia. Muitas pessoas convocadas diante dos inquisidores, que se arrependiam, eram liberadas depois de terem prometido emendar suas vidas e fazer as penitências ordenadas, tais como: jejuns, vestir a roupa penitencial durante um determinado período de tempo e a reclusão, que frequentemente era na própria casa do penitente. Torturas e execuções na fogueira nunca foram partes da solene cerimônia religiosa denominada "Auto-de-Fé", onde os penitentes abjuravam seus erros e faziam retratação pública ao pronunciarem o seu ato de fé.
- Para melhor entendermos esta questão, convém lembrar o fato de que as punições extremas que aconteciam durante a Idade Média, tais como as execuções na fogueira (as quais, tanto eu quanto você certamente condenamos), eram muito comuns em todas as partes do mundo naqueles tempos. Tais punições não tiveram origem durante a Idade Média, mas eram lei bem antes da Era Cristã. Tais punições não chocavam as pessoas daquele tempo mais do que as pessoas do nosso país se chocam hoje em dia pela pena de morte nas câmaras de gás, injeções letais, enforcamento, fuzilamento, eletrocução etc., penalidades estas, muitas vezes impostas por seqüestros e roubos, bem como por assassinatos e traições. Por favor, não conclua a partir disso que as pessas naqueles tempos eram menos misericordiosas do que nós somos atualmente. Tais punições eram praticadas com muito mais frequência e por muito menores ofensas na Inglaterra protestante (a fonte de onde emanou boa parte da literatura anti-católica) do que na Espanha Católica. Como evidência eu recomendaria ler a "Reforma Protestante", de William Cobbett, grande historiador inglês.

Convém ainda lembrar o fato de que o Judaísmo inflingiu os mesmos tipos de punição severa bem antes da Era Cristã, quando a blasfêmia era considerada uma grande ofensa dirigida contra o Deus Altíssimo. E foi exatamente por essa ofensa - embora falsa a acusação - que o Sinédrio, dirigido pelos sumos sacerdotes, declarou Jesus réu de morte por ter se declarado o Messias. Quanto à pergunta: "Quais eram os tipos de penas capitais de acordo com a Lei Judaica?", o "O Oráculo", uma publicação judaica, respondeu em um dos seus artigos:

"De acordo com a Lei Judaica havia quatro tipos de execução: apedrejamento, fogueira, à espada e enforcamento. A morte por estrangulamento ou enforcamento não consta nas Sagradas Escrituras, mas os rabinos interpretavam que onde quer que a pena de morte fosse mencionada sem especificar o método, geralmente, era de enforcamento que se tratava" (Carl Alpert, Boston, 1935, p.77).

Tais penas capitais eram impostas pelo Judaismo, não apenas nos casos de blasfêmia, mas também pela violação do repouso sabático, por bruxaria, idolatria, recusa em submeter-se aos decretos dos sacerdotes ou juízes, e por uma dezena de outras ofensas, que incluíam também o assassinato.
- Para melhor entender esta questão, é necessário lembrar o fato de que a Igreja Católica não pode ser mais culpada pelos abusos da Inquisição Espanhola - a qual terminou com a deportação de aproximadamente cento e sessenta mil judeus (inclusive muitos que foram considerados isentos de culpa em matéria de ofensas contra a Santa Igreja ou o Estado) - do que o Judaismo pela perseguição do Povo de Edom, descendente de Esaú. A mente do povo judeu foi muito envenenada contra a Igreja Católica por meio de histórias falaciosas sobre a Santa Inquisição; ao passo que é muito difícil encontrar católicos que tenham ouvido falar a respeito da perseguição dos idumeus pelos judeus. Eu cito isso baseado na obra "A história dos Judeus", de Graetz, embora a mesma coisa possa ser encontrada na Enciclopédia Judaica e em muitas outras publicações judaicas recomendadas:


"Depois da vitória sobre os Samaritanos, Hircano marchou contra os idumeus, apossou-se de suas duas fortalezas, e depois de tê-las demolido, deu aos idumeus a alternativa de optarem entre a conversão ao Judaismo ou o exílio".

Pela primeira vez o Judaismo, na pessoa de seu líder Hircano (sumo sacerdote), praticou intolerância contra outro credo, mas logo logo provou com profunda dor o quão é injurioso permitir que o zelo religioso pela preservação da fé acabe se degenerando em desejo pela violenta conversão dos outros.
Essas conversões forçadas do povo de Edom, provocaram uma dolorosa experiência da qual o judaismo nunca mais se recuperou. Isso prejudicou o Judaismo mais do que Esaú prejudicou ao seu irmão Jacó (de quem os idumeus eram descendentes). Isso fez com que o Judaismo fosse entregue a Herodes (idumeu), que impiedosamente deu fim à dinastia de Judas Macabeu e à linhagem dos sumos sacerdotes. Foi Herodes quem apontou os novos sumos sacerdotes (incluindo Anás e Caifás) e tomou o governo dos judeus, aliando-se finalmente com Tito na sede de Jerusalém.

Tudo isso, bem entendido, permanece o fato de que a Inquisição Espanhola tem muito mais do que apenas ser lembrada e lamentada por seus abusos. Ela foi uma necessidade para as condições daquele tempo, e que certamente não pode ser corretamente compreendida pelas condições do nosso tempo presente. Nossos "métodos de pressão e coerção" por mais drásticos que sejam, não podem ser comparados com os métodos usados no mundo durante os tempos da Inquisição e por muitos séculos antes da Era Cristã. A deportação, a qual foi o climax da Inquisição Espanhola em 1492 é sempre digna de reprovação por causa de seu caráter indiscriminatório e arbitrário. Segundo o historiador judaico Dr. Baron, isso se deu porque as cortes inquisitoriais não conseguiram checar a influência judaica sobre os conversos (convertidos), os falsos convertidos da Sinagoga para a Santa Igreja e que segundo a Enciclopédia de Conhecimentos Judaicos, "foram a causa direta da Santa Inquisição".
Independente do que se diga sobre os abusos da Inquisição Espanhola, embora sejam dignos de reprovação, os dois fatos seguintes deveriam remover da mente dos judeus aquele histórico obstáculo para um exame isento de preconceitos sobre os ensinamentos da Igreja Católica.
Primeiro, a Igreja Católica tinha o legítimo direito de se livrar dos pseudos convertidos do Judaísmo, do mesmo modo como os sacerdotes e o Sinédrio no Judaísmo se julgavam no direito de condenar os membros de sua sinagoga que violavam a Lei Mosáica. A Igreja Católica de fato, tinha um direito muito maior de o fazê-lo, do que aqueles descendentes dos judeus espanhóis deportados que excomungaram Spinoza e outros judeus panteístas da Sinagoga de Amsterdam, finalmente, expulsando-os da Holanda. Heinrich Graetz relata:
"Os rabinos de Amsterdam introduziram a novidade de apresentarem diante da sede do julgamento, opiniões e convicções religiosas, formando eles próprios uma espécie de Tribunal Inquisitorial judaico, o qual, embora não fosse sangrento, não era menos doloroso para aqueles que eram punidos" (História dos Judeus, Vol. 4, pag 684).
Em segundo lugar, se nosso país pode legalmente submeter homens a interrogatórios, a campos de concentração e prisões, deportá-los, bem como alinhá-los em paredões de fuzilamento por sabotagem, espionagem, atividades de "quinta coluna" e outros atos de traição durante nossas curtas guerras, então o Governo espanhol também tinha todo o direito de assim proceder, considerando que estava em estado de guerra já há séculos contra os muçulmanos.
Mas voltando novamente ao seu questionamento, se eu não deveria ter me tornado católico por causa das injustiças perpetradas contra os judeus pelos católicos da Espanha, então você também deveria renunciar ao Judaísmo por causa das injustiças cometidas pelos judeus contra o povo de Edom. Tal lógica, à qual podemos captar do sentimento expresso em seu questionamento, vai fortemente contra você mesmo, porque os abusos da Inquisição Espanhola foram cometidos pelo Estado; ao passo que a circuncisão forçada dos idumeus, foi obra do Judaísmo oficial.

Eu telefonei para checar sobre o Sr. C. F. Sua compreensão acerca do Judaísmo, como o da maioria dos judeus americanos, está limitada a saber que os judeus são circuncidados, fazem o barmitzvah, guardam os sábados, Sabbath, Yon Kippur e Rosh Hashanah, não comem carne de porco etc., mas quando se fala dos verdadeiros princípios judaicos, ele é tão pobre em conhecimentos que se faz necessário falar do Judaísmo para ele, afinal, sem tal conhecimento, é impossível compreender que o Judaísmo em toda a sua plenitude é o verdadeiro Cristianismo. Sobre a Inquisição Espanhola, ele sabia bem, e mais, queria saber se "a Igreja Católica ainda considera os não católicos como heréticos, como ela fazia com os judeus e muçulmanos da Espanha nos tempos da Inquisição". Isso não foi surpresa para mim, visto que de todas as coisas relacionadas à Igreja Católica durante os seus vinte séculos de existência, a Inquisição Espanhola é a fixação principal na mente dos judeus. Considerando que a minha conversação com o seu amigo ocorreu logo depois que eu havia lhe escrito sobre a Inquisição Espanhola, creio que uma palavra a respeito de heresia e heréticos poderá adicionar alguma coisa mais à sua escassa compreensão sobre o assunto.
Já se tornou lugar comum para os não católicos, alegarem que os judeus na Espanha eram considerados culpados de heresia; e que ambos, judeus e protestantes, são considerados pelos católicos como heréticos. Esta é uma falsa noção baseada no fato de que as acusações de heresia feitas pela Igreja Católica sempre foram contra aqueles que se professam católicos e não contra pessoas que abertamente professam serem judeus, muçulmanos ou protestantes, muito embora elas acreditem em algumas coisas que segundo a Igreja são heresia.
Os Maranos foram julgados e corretamente culpados de heresia. Eles estavam sobre a jurisdição da Igreja Católica pelo fato de terem aceitado o Batismo; portanto, faziam uma pública declaração de que eram católicos, ao passo que secretamente seguiam práticas judaicas, o que na verdade era um comportamente herético. Foi a ação deles que causou a instituição da Santa Inquisição na Espanha em 1480, a qual durou até 1492.
A heresia é um pecado, e isto é declarado tanto na Lei judaica como na cristã. Em Gálatas 5,20, São Paulo enumera as heresias entre "as obras da carne". Um católico que nega um ou mais ensinamentos de Cristo, é considerado pela Santa Igreja como um herege. A Igreja Católica ensina com absoluta autoridade em matéria de fé e moral; portanto, ela é obrigada a declarar o mesmo que São Paulo: "Mas, ainda que alguém - nós ou um anjo baixado do Céu - vos anunciasse um Evangelho diferente do que vos temos anunciado, que eles sejam anátema" (Gal 1,8).
Isto se aplica à negação de um único princípio básico do Cristianismo, pois negar mesmo que seja um só ensinamento de Deus, é negar o próprio Deus. Portanto, um católico que proclama acreditar em apenas nove dos Dez Mandamentos, é um herege; da mesma forma como a negação de um só dos Dez Mandamentos é a negação de Deus como seu Autor. O mesmo se aplica a cada artigo do Credo dos Apóstolos, bem como aos demais ensinamentos da Santa Igreja.
A heresia propriamente dita, é pior que assassinato. O assassinato rouba do homem a sua vida física, a qual por melhor que seja é limitada a um curto período de anos; ao passo que a heresia rouba do homem a sua herança espiritual; mata a alma, e como resultado disso, o herege é privado da Felicidade Eterna, caso venha a morrer sem arrependimento.
Julgamentos e punições por heresia tiveram sua origem no Judaísmo, e não no Catolicismo, e seus objetivos sempre foram manter nos corações a pureza dos ensinamentos de Deus, bem como salvaguardar o prêmio da vida eterna. Examinando o capítulo da "Vallentines Jewish Encyclopedia" no capítulo "Heresias e Hereges", buscando uma melhor compreensão do conceito ortodoxo judaico a esse respeito encontramos:

"O termo herege em conexão com o Judaísmo, pode convenientemente ser aplicado a qualquer um que não aceita os dois Torahs - o Escrito e Oral - nos quais estão contidos todo o ensinamento judaico. Além dos idólatras dos tempos antigos, o Talmude reconhece quatro tipos principais de hereges, os quais contudo, não estão cuidadosamente distintos: (1) os Samaritanos, que aceitavam apenas o Pentateuco e o livro de Josué como inspirados, e rejeitavam o resto das Escrituras; (2) os Saduceus, que rejeitavam a Lei Oral; (3) os Minim, os judeus-cristãos (que se convertiam da Sinagoga para a Santa Igreja) e os Gnósticos que desejavam suplementar o Torah de Moisés com uma outra Torah de autoridade superior; (4) Os Apikorsim, que negavam a origem divina do Torah. A heresia Karaite, a qual apareceu mais tarde, foi essencialmente a mesma dos Saduceus" (p. 279).

Acusações de heresia não são tão freqüentes entre os não católicos hoje em dia como eram no passado, e isso por causa do indiferentismo religioso e da incoerência teológica. Em nosso país [EUA], no qual residem aproximadamente um terço dos judeus de todo o mundo, um homem pode acreditar em qualquer coisa e nada ao mesmo tempo, e ainda assim, ser considerado pelos filhos de Israel como judeu. O rabino Stephen Wise costumava se erguer em sua "Sinagoga Liberal", em Carnegie Hall e gritar: "Eu não acredito que os Dez Mandamentos foram escritos por Deus nas tábuas de pedra e entregues a Moisés no Monte Sinai. Se isto é heresia, então que me expulsem da Sinagoga".
Esta sensacional declaração rendeu-lhe uma desejada primeira página em toda a imprensa através do país. Naturalmente, que ninguém pode ser acusado de heresia numa sinagoga isenta de todo o dogma e do controle de qualquer um que não seja o próprio rabino. A heresia só assume o seu verdadeiro caráter onde a fé e a prática são definidos por uma autoridade, como é o caso da Igreja Católica. Portanto, eu perguntei naquela época: "Quem tem o direito de julgar o rabino Wise por heresia, num púlpito onde ele pode falar qualquer coisa que ele deseje, do modo que lhe seja o mais conveniente possível?". O rabino estava apenas encenando uma "peça teatral" quando ele desafiou qualquer um a julgá-lo por negar um milagre mosaico. O assim chamado "judeu dos judeus", Einstein, foi um pouquinho ainda mais adiante. Ele negou acreditar em um Deus pessoal, enquanto dava uma palestra num Seminário Teológico judeu. E por acaso ele foi acusado de heresia? De modo algum! Ele com certeza deveria ter sido, e isso seria uma decisão correta, já que ele era membro de uma Sinagoga Ortodoxa.

Eu disse em minha última carta sobre Spinoza, o qual, por se negar a acreditar num Deus pessoal, foi excomungado pelos descendentes dos judeus deportados da Espanha e Portugal devido à conduta herética dos maranos. Spinoza foi banido de Amsterdam, e para evitar o seu assassinato depois de um atentado perpetrado contra sua vida, abandonou a sua cidade natal onde "maldições" foram lançadas contra ele pelos rabinos da Sinagoga que ele frequentava. Gabriel da Costa é outro notável judeu, cuja vida trágica e tratamento por esses judeus de Amsterdam devido aos seus ensinamentos heréticos foi ainda mais dramático. Isso inspirou Gutzkows a escrever a tragédia "Uriel Acosta" e Zangwill a escrever "Sonhadores do Gueto". A sua negação da imortalidade da alma foi corretamente chamada de heresia. Os rabinos fizeram com que ele fosse preso em Amsterdam, aplicaram-lhe uma multa de $300 guilders, e seu livro, de caráter heterodoxo, foi publicamente queimado. Vejamos o que disse a Enciclopédia de Conhecimentos Judaicos a esse respeito:

"Ele fugiu para Hamburgo, mas logo retornou a Amsterdam e, em 1633, se tornou aquilo que ele disse em suas próprias palavras, 'um macaco entre os macacos', oferecendo sua total submissão à sinagoga. Ele porém não conseguia ser rigoroso e suas contrariedades acabaram fazendo com que ele fosse sujeito ao chamado 'Grande Banimento'. Por sete anos ele viveu silencioso e solitário, boicotado até mesmo por seus próprios parentes. Finalmente, ele se rendeu, fez a confissão de seus erros e sofreu a ignominiosa punição das 39 chicotadas públicas. Depois ele foi para casa escreveu o apaixonado rascunho de sua própria vida intitulado "Espécime da Existência Humana' e então cometeu suicídio com um tiro".





Que aquelas acusações contra Spinoza e da Costa eram justificadas, isto ninguém pode negar, pois os judeus de Amsterdam possuíam um código doutrinal definido, o qual eles corretamente sustentavam, do mesmo modo como faziam a Igreja e o Estado na Espanha. E mais ainda, esses mesmos rabinos que pertenciam à comunidade de Amsterdam, a qual foi formada basicamente pelos maranos, "aqueles que fingiam ser Católicos, e que amaldiçoaram a Igreja Católica e a Espanha pela deportação de seus ancestrais, achavam-se no direito de amaldiçoar, chicotear, excomungar e expulsar de Amsterdam aqueles seus irmãos israelitas julgados e acusados de heresia". Para esses descendentes dos ibéricos, um "Auto-de-Fé" holandês era algo perfeitamente legítimo e normal, só não era para a Espanha ou Portugal onde o bem-estar tanto do Estado como da Igreja estavam em risco.
Eu trouxe comigo um folheto de quatro páginas, que estava sendo distribuido nas ruas de Boston quando visitei o Copley Plaza Hotel. Este folheto falava dos "rumores - mentiras - enganações" que estavam sendo propagadas por agentes de Hitler, Mussolini e Hiroito. Tal folheto convocava todos os cidadãos a denunciarem tais "quintas colunas" ao Comitê de Segurança Pública do Estado de Massachusetts. Eu perguntei naquela época, e agora pergunto a você, sr. Isaacs, se é correto durante a presente guerra mundial, como acreditamos que é, delatar tais "promotores de desordens" que estão tentando "dividir para conquistar e colocá-los em Campos de Concentração se forem considerados culpados". Então, porque não era perfeitamente legítimo punir os hereges na Espanha que fingiam ser católicos, de modo a minarem tanto o Estado quanto a Santa Igreja? Lembre-se que os maranos foram os "quintas colunas" do século XV.

A Inquisição no Brasil

Autor: D. Estevão Bitencour
Fonte: Site Cleofas
A Inquisição no Brasil
D. Estevão Bettencourt, osb
No Brasil nunca houve tribunal do Santo Ofício ou da Inquisição. O país achava´se sob a competência do tribunal de Lisboa. Durante o século XVI, a Inquisição agiu discretamente. São conhecidos três processos e uma visita do Santo Ofício, sem graves conseqüências. Misturavam´se, às vezes, fatos reais de índole religiosa ou político´social com faltas graves aparentes ou supostas ou tendências perniciosas no campo religioso e social. A Inquisição no Brasil foi extinta em 1774 quando o Santo Ofício foi oficialmente transformado em tribunal régio, sem autonomia ou completamente dependente da Coroa. A Inquisição de Portugal contava três distritos: Évora, Coimbra e Lisboa, tendo este a jurisdição sobre o Brasil. Seja brevemente examinado o seu funcionamento no Brasil.
1. Século XVI
Como a Inquisição no Brasil estivesse sob a jurisdição do Tribunal de Lisboa, não houve na colônia, em nenhuma época, um tribunal próprio. Assim sendo, os processos eram levados para a Corte. No Brasil, os Inquisidores eram os Bispos. Mas, visto o grande número de novos convertidos, foi nomeado Inquisidor Apostólico D. Antonio Barreiros. Seus poderes limitavam´se aos cristãos´novos; era´lhe recomendado usar de prudência, moderação e respeito. A ação do Santo Ofício foi discreta, sendo conhecidos três processos e uma visita do Inquisidor de Portugal.
1.1. Os Processos
a. Processo de Pero de Campo Tourinho, donatário da capitania de Porto Seguro, acusado de opor´se ao clero e ao Papa, e de desrespeitar as leis da Igreja. O processo iniciou´se no Brasil (1546) e terminou em Lisboa (1547). Não se sabe a conclusão. Supõe´se que o acusado tenha sido absolvido.
b. Processo de João de Bolés (Jean Cointha, seigneur des Boulez), francês que viera com Villegaignon. Em 1557 começou a difundir doutrinas calvinistas e luteranas em São Paulo e depois na Bahia. O processo, iniciado no Brasil (1560), foi levado a Portugal, tendo João de Bolés lá chegado em 1563. Retratou´se, mas pouco depois começou novamente a difundir suas idéias, sendo então desterrado para as índias, onde foi condenado à morte, em 1572, como relapso e herege.
c. Processo do Pe. Antonio de Gouveia. Oriundo dos Açores, foi ordenado sacerdote em Portugal. Em 1555 entrou na Companhia de Jesus, sendo dela despedido tempos depois. Deu´se à necromancia e, por isto, foi acusado no Tribunal da Inquisição. Preso, fugiu em 1564. Recapturado, foi degredado para os Açores. Tendo novamente fugido, foi descoberto de 1567 e desterrado para Pernambuco. Aqui conseguiu uso de ordens, mas, continuando as atividades ´mágicas´, foi preso e enviado ao Santo Ofício de Lisboa, embarcando em 1571. Em 1575 seu processo continuava, mas a partir desta data nada mais se sabe dele.
1.2. A primeira visitação do Santo Ofício
De 1591 a 1595 deu´se a primeira visitação do Santo Ofício ao Brasil. A causa próxima foi a passagem da Colõnia ao domínio espanhol em 1580. Como o rei da Espanha possuísse idéias mais rígidas quanto aos cristãosnovos, julgou necessária uma visita do Santo Ofício.
O Visitador nomeado, Heitor Furtado de Mendonça, chegou à Bahia em julho de 1591. Poucos dias depois publicou o ´Edito da Graça´, período de trinta dias (de 28/7 a 27/8) em que haveria ´muita moderação e misericórdia´ aos que fossem acusados ou se viessem acusar. Houve muitas denúncias, versando sobre suspeitas de heresia, de judaísmo, escravização dos indígenas, bigamia etc. Em 1594 o Visitador passou a Pernambuco onde, após um período de ´Graça´, iniciou as audiências, seguindo até o ano de 1595, quando retornou a Lisboa. A par de algum erro ou imprevidência, não parece ter sido severo, usando, em muitos casos, de moderação.
2. Século XVII
Data deste século a segunda visita do Santo Ofício. Esta ocorreu entre setembro de 1618 e janeiro de 1619, sendo Inquisidor D. Marcos Teixeira. Os motivos devem prender´se à preocupação da Coroa Espanhola com os cristãos´novos, temendo que pudessem aliar´se aos holandeses, que naquele tempo pressionavam o Reino Unido. A colõnia, de fato, tornara´se lugar de refúgio e de degredo para os novos convertidos, que aqui se achavam em grande número.O Pe. Antonio Vieira, nessa época, defendeu a tolerância para com os cristãos´novos, idéia que se generalizou e continuou viva mesmo após a restauração, em 1640.
3. Século XVIII



Surgindo as minas de ouro, para as quais ia grande número de estrangeiros de todos os Credos, a política de tolerãncia vigente no século anterior começou a mudar. Intensificou´se a ação da Inquisição no Brasil. No reinado de D. José I (1750´77), a Inquisição decaiu, chegando praticamente a anular´se. Dois fatores contribuiram para a sua queda, ambos ligados à personalidade do Marquês de Pombal. Primeiramente, o Primeiro´ministro considerou´a contrária aos interesses da Corte, embora anos antes (1761) a tivesse utilizado contra o Pe. Gabriel Malagrida, por ter este, na ocasião do terremoto de Lisboa (1755), acusado de erros morais os membros da Corte. Além disto, em virtude de um desentendimento entre Pombal e o Santo Ofício em Portugal, chegou o rei D. José I a procurar minorar a ação do Tribunal. Assim é que em 1773 foram baixadas leis que acabaram com a distinção entre cristãos´novos e outros cristãos, e que proibiam qualquer discriminação por ascendência judaica. Em 1774 o Santo Ofício foi transformado num tribunal régio, sem autonomia, completamente dependente da Coroa, o que significou na prática a sua desativação. ´Não obstante as falhas que se podem apontar contra todo e qualquer sistema repressivo, não é lícito nem honesto ver na atuação da Inquisição ou Santo Ofício somente a face negativa. Houve também vantagens para a fé e os bons costumes, evitando´se tolerância em demasia com desvantagens para a pureza da fé ou com tropelos dos mandamentos divinos, visto que a Inquisição não empregava somente a repressão, mas também a persuasão para corrigir desvios na fé ou nos costumes. Ademais, para muita gente que se deixa levar mais pelo temor que pelo amor, por muitas causas que não é o caso de abordar, toda ação coercitiva, quando psicologicamente bem orientada, pode ter seus reflexos positivos. Aliás, o Santo Ofício era, antes do mais, um tribunal eclesiástico que tinha em mente mover o culpado a reconhecer seu pecado, detestá-lo e prometer emenda. Só em casos de pertinácia agia com penas que variavam segundo a gravidade do delito e a renúncia ao perdão. No Brasil, felizmente, durante o século XVI, não temos a lamentar a pena capital entre os nascidos na terra, mesmo quando encaminhados ao tribunal de Lisboa´ (RUBERT, Arlindo. A Igreja no Brasil. Origem e desenvolvimento (Século XVI), vol. 1. Santa Maria, Pallotti, 1981, p. 284). 
Poder Régio e Inquisição em Portugal

Autor: D. Estevão Bitencour
Fonte: Site Cleofas
Poder Régio e Inquisição em Portugal
D. Estevão Bettencourt
Em síntese: O Instituto Histórico e Geográfico do Brasil publicou os Regimentos da Inquisição em Portugal (vigentes também no Brasil) datados de 1552, 1613, 1640 e 1774 (este assinado pelo Marquês do Pombal). São acompanhados de uma Introdução redigida pela Profá Sônia Aparecida de Siqueira, que põe em evidência o fato de que a Inquisição nunca foi uma instituição meramente eclesiástica, mas, em virtude da lei do padroado, foi mais e mais dirigida pela Coroa de Portugal em vista de seus interesses políticos. A Santa Sé teve de se opor mais de uma vez aos processos da Inquisição, a fim de tutelar os cristãos´novos e outros cidadãos julgados pelo Tribunal.
A Inquisição está sempre em foco. É motivo de acusações à Igreja, muitas vezes mal fundamentadas ou repetidas como chavões, sem que o público tenha acesso aos documentos básicos que nortearam a Inquisição. Poucas pessoas têm contato direto com os arquivos e as fontes escritas do movimento inquisitorial.
Eis que o Instituto Histórico e Geográfico do Brasil (IHGB) publicou no número 392 (ano 157) da sua revista, correspondente a julho/setembro 1996 (pp. 495´1020) os Regimentos do Santo Ofício da Inquisição do Reino de Portugal datados de 1552, 1613, 1640, 1774 (este assinado pelo Marquês de Pombal), além de um Regimento sem data. Tal edição esteve aos cuidados da ProP Sônia Aparecida de Siqueira, sócia´correspondente do IHGB em São Paulo, que escreveu longa Introdução a tais documentos. Como nota o Prof. Arno Wehling, presidente do IHGB em 1996, a Dra´ Sônia Aparecida ´localizou a Inquisição e seus sucessivos regimentos nos diferentes momentos históricos, sublinhando, inclusive, a progressiva expansão do poder real sobre a instituição, culminando no regime sectarista´ (p. 495).
Como se sabe, a Inquisição nunca (nem na Idade Média) foi um Tribunal meramente eclesiástico. Isto era inconcebível outrora, dado que o Estado era oficialmente cristão e, por isto, se julgava responsável pelos interesses da fé cristã; a tal título intervinha ele em questões de foro religioso, por vezes ditando normas àIgreja. Tal realidade se acentuou na pensínsula ibérica (Espanha e Portugal) a partir do século XVI, em virtude dos privilégios do padroado. Com efeito, já que os reis de Espanha e Portugal eram descobridores de novas terras, às quais levavam a fé católica, a Santa Sé lhes concedeu poderes especiais para organizarem a vida da Igreja nas regiões recém´descobertas; daí a grande ingerência nos assuntos religiosos, a título de colaboração com a Igreja, ... colaboração que redundou, aos poucos, em sufocação da autoridade eclesiástica em favor dos interesses da Coroa.
Nas linhas subseqüentes, apresentaremos as origens da Inquisição em Portugal e alguns traços da explanação da Profá Sônia Aparecida, que põem em relevo a intervenção sempre mais prepotente dos monarcas em assuntos inquisitoriais.
1. Origens da Inquisição Portuguesa
O rei D. João III de Portugal (1521´57) desejava que o Papa estabelecesse a Inquisição em seu reino, tendo em vista especialmente a eliminação dos judeus não plenamente convertidos ao Cristianismo. Durante 27 anos, S. Majestade e a Santa Sé se defrontaram, visto que o rei pedia poderes, em matéria religiosa, que o Papa não lhe queria conceder: assim, conforme o monarca, o Inquisidor´mor seria escolhido pelo rei, assim como os outros Inquisidores (subordinados), podendo estes últimos ser não apenas clérigos, mas também juristas leigos, que passariam a ter a mesma jurisdição que os eclesiásticos. Mais: conforme o desejo do rei, os Inquisidores estariam acima dos Bispos e dos Superiores das Ordens Religiosas, de modo que poderiam processar e condenar eclesiásticos sem consultar os respectivos prelados; os Bispos ficariam impedidos de intervir em qualquer causa que os Inquisidores chamassem a si. Ainda: os Inquisidores poderiam impor excomunhões reservadas à Santa Sé e levantar as que eram impostas pelos Bispos. Como se vê, o rei queria desta maneira obter o controle total sobre os Bispos e a Igreja em Portugal.
Finalmente aos 17/12/1531 o Papa Clemente VII concedeu a Inquisição em Portugal, mas em termos que contrariavam às solicitações de D. João III: em vez de outorgar ao rei poderes para nomear os Inquisidores, o Papa nomeou diretamente um Comissário da Sé Apostólica e Inquisidor no reino de Portugal e nos seus domínios. Esse Comissário poderia nomear outros Inquisidores, mas a sua autoridade não estava acima da dos Bispos, que poderiam também, por seu lado, investigar as heresias.
Os termos desta Bula ou concessão nunca foram aplicados em Portugal. O Inquisidor nomeado, Frei Diogo da Silva, era o confessor do rei; não aceitou o cargo, talvez por pressão do monarca. Apesar disto, em meio a grande agitação popular, começaram a funcionar tribunais inquisitoriais em algumas dioceses anarquicamente. Em conseqüência, o Papa suspendeu a Inquisição e, alegando que o rei o enganara (escondendo´lhe a conversão forçada de judeus no reinado de D. Manoel, 14951521), ordenou a anistia aos judeus e a restituição dos bens confiscados (Bula de 07/04/1535).
As razões sobre as quais se baseavam tais decisões de Clemente VII, são assaz significativas: a conversão ´dos judeus infiéis deve ser propiciada mediante a persuasão e a doçura, das quais Cristo deu o exemplo, respeitando sempre o livre arbítrio humano; a conversão violenta ou extorquida dos judeus sob o reinado de D. Manoel era tida como façanha que não se deveria reproduzir. A Santa Sé assim procurava defender e proteger os cristãos´novos, vítimas do poder régio.
O Papa Clemente VII, que resistira a D. João III, morreu em 1534, tendo por sucessor Paulo III. O rei voltou a insistir junto ao Pontífice para conseguir o tipo de tribunal de Inquisição que atendia aos interesses da Coroa. Não o obteve propriamente, mas por Bula de 23/05/1536 Paulo III restabeleceu a Inquisição em Portugal, nomeando três Inquisidores e autorizando o rei a nomear outro; além disto, o Pontífice mandava que, durante três anos, os nomes das testemunhas de acusação não fossem acobertados por segredo e durante dez anos os bens dos condenados não fossem confiscados; os Bispos teriam as mesmas faculdades que os Inquisidores na pesquisa das heresias. Por intermédio de seu Núncio em Lisboa, o Papa reservava a si o direito de fiscalizar o cumprimento da Bula, de examinar os processos quando bem o entendesse e de decidir em última instância.
É a partir desta Bula (23/05/1536) que se pode considerar estabelecida a Inquisição em Portugal. O rei, que não se dava por satisfeito com as disposições da Santa Sé, começou a burlá´las. Quis, antes do mais, subtrair a Inquisição à vigilância do Pontífice e, para tanto, suscitou incidentes numerosos a ponto de obrigar a partir o Núncio Capodiferro, que tinha poderes para suspender o tribunal, caso não fossem respeitadas as cláusulas de proteção aos cristãos´novos. Além disto, nomeou Inquisidor o Infante D. Henrique, seu irmão, então arcebispo de Braga, que, com seus 27 anos, não tinha idade legal para exercer tais funções. Enfim aproveitava ou provocava ocasiões ou pretextos para fazer que o público cresse na má fé dos judeus convertidos (cristãosnovos): assim apareceu um cartaz nas portas da catedral e de outras igrejas de Lisboa, anunciando a chegada próxima do Messias ...; um alfaiate de Setúbal apresentou´se ao público como Messias ´ o que não foi levado a sério pela população, mas bastou para que os agentes do rei fizessem grandes represálias e tentassem convencer Roma dos perigos do judaísmo em Portugal.
Apesar da má vontade do rei, o Papa fazia questão de manter sob seu controle o Santo Ofício em Portugal. Reforçando normas anteriores, o Pontífice emitiu nova Bula em 12/10/1539, que proibia aduzir testemunhas secretas e concedia outras garantias aos acusados, entre as quais o direito de apelação para o Papa; determinava outrossim que os emolumentos dos Inquisidores não fossem pagos mediante os bens dos prisioneiros.
Também esta Bula não foi observada em Portugal. O Papa então resolveu suspender a Inquisição pelo Breve de 22/09/1544; tomou a precaução de fazer publicar de surpresa em Lisboa este documento, levado secretamente para lá por um novo Núncio. O rei, profundamente golpeado, jogou a sua última cartada; requereu ao Papa que revogasse a suspensão e restaurasse a Inquisição sem qualquer limitação, e acrescentava a ameaça: ´Se Vossa Santidade não prover nisso, como é obrigado e dele se espera, não poderei deixar de remediá´lo confiando em que não somente do que suceder Vossa Santidade me haverá por sem culpa, mas também os príncipes e os fiéis cristãos que o souberem, conhecerão que disso não sou causa nem ocasião´.
Tais palavras continham a ameaça de desobediência formal ao Papa e de cisão na Igreja. D. João III seguiu o conselho que lhe fora dado pelos seus dois enviados à Santa Sé em 1535: negasse obediência ao Papa, imitando o exemplo do rei Henrique VIII da Inglaterra. Entre a obediência ao Papa, como fiel católico, e a rebeldia declarada que lhe permitisse instituir um tribunal, que era no fundo um instrumento da política régia, o rei de Portugal estava disposto a seguir a segunda via.
O Pontífice via´se naquele momento (1544/45) premido por outras graves preocupações, como a convocação e a preparação do Concílio de Trento, sobre o qual o Imperador Carlos V e outros monarcas tinham seus interesses. Em conseqüência, acabou por aceitar os pontos principais da solicitação de D. João III: por Bula de 16/07/1547, nomeou lnquisidor´Geral o Cardeal Infante D. Henrique e retirou aos Núncios em Lisboa a autoridade para intervirem nos assuntos de alçada da Inquisição; esta seguiria seus trâmites próprios, diversos dos habituais nos processos comuns. Ao mesmo tempo, porém, o Papa mitigava suas disposições: promulgou um Breve que suspendia o confisco de bens por dez anos; outro Breve suspendia por um ano a entrega de condenados ao braço secular (ou a aplicação da pena de morte). Em outro Breve ainda o Papa fazia recomendações tendentes a moderar os previsíveis excessos da Inquisição e a permitir a partida dos cristãos´novos para o estrangeiro. Pouco antes de morrer ou aos 08/01/1549, Paulo III editou novo Breve, que abolia o segredo das testemunhas ´ Breve este que provavelmente nunca foi aplicado em Portugal.
2. Inquisidor sempre mais regalista
Eis algumas passagens muito significativas da Introdução redigida pela Prof. Sônia Aparecida:
2.1. Cristãos novos
´Urgia acalmar a inquietação causada pela presença dos cristãos´novos, inimigos em potencial pelo seu supranacionalismo. O combate às minorias dissidentes era um programa inadiável. Os neocristãos podiam ser portadores do fermento herético por suas crenças residuais e por seus íntimos contatos com luteranos e judeus. E mais. Com a frutificação das descobertas, da exploração do mundo colonial que se montava, com o comércio ultramarino, com a urbanização progressiva, os cristãos´novos ganhavam força econômica e tendiam a uma solidariedade que lhes acrescia o poder de ação no meio social. O trono sentiu a ameaça que representariam se não fossem bons cristãos. Reagiu. A Inquisição foi criada e estendeu´se sobre cristãos´novos, cristãos´velhos, povo, hierarquias´ (pp. 502s).
´Certas determinações de Roma avocando a si, diretamente, ou por meio de seus Núncios, jurisdição sobre os cristãos´novos revelam que existia ainda uma certa indefinição da hierarquia judicial, bem como o propósito pontifício de reservar para a Cúria a jurisdição superior. Em 1533, a Bula de Clemente VII Sempiterno Regi revogou todos os poderes que haviam sido outorgados a Frei Diogo da Silva, Inquisidor´mor de Portugal, chamando a si todas as causas dos cristãos´novos, mouros e heréticos. Em 1534, um Breve de Paulo III dirigido a D. João III mandava que os Inquisidores suspendessem os processos contra pessoas suspeitas de heresia. Em 1535, uma Carta Pontifícia determinava que os Núncios de Portugal pudessem conhecer as apelações dos cristãos´novos.
No mesmo ano, escrevia Paulo III ao rei sobre os cristãos´novos, e aos cristãos´novos; interferindo diretamente na definição do processo, concedia que pudessem tomar por procuradores e defensores quaisquer pessoas que quisessem.
As Bulas de perdão geral que paralisavam a ação do Tribunal vinham de Roma, diluindo, de tempos em tempos, a autoridade dos Inquisidores. Confirmando o primeiro perdão concedido por Clemente VII, concedia Paulo III um segundo em 1535 e, em 1547, pela Bula Illius qui misericors, concedia um terceiro. Ao depois, outros indultos gerais foram sendo concedidos, e, quando o próprio rei os negociava com os cristãos´novos, tinha de pleiteá´los junto à Cúria Romana, como aconteceu com Felipe III em 1605.
Aliás, as intromissões da Cúria nas atividades da Inquisição continuaram, decrescentes sem dúvida, mas constantes pelo tempo afora, dada a natureza de sua justiça. De 1678 a 1681, o Santo Ofício chegou a ser suspenso em Portugal por decisão do Pontífice, o que indica que, apesar da amplificação do absolutismo, os tribunais continuavam a carecer da aquiescência de Roma para atuar´ (pp. 506s).
2.2. A figura do Inquisidor
´Capaz, idôneo, de boa consciência, devia ser o Inquisidor: requisitos que garantiriam a aplicação da justiça com equanimidade. Pedia´se também constância...´ (p. 526). ´O juízo coletivo sobre a Inquisição dependeria do comportamento de seus oficiais, de sua capacidade de corrigir as próprias imperfeições, de imolar impulsos e interesses em prol do bom nome do Tribunal. A verdade é que, na prática, ou por causa da vigilância social, ou do controle institucional, ou, talvez, da fusão dos ideais individuais com os do Santo Ofício, não temos notícia de escândalos ou abusos dos agentes inquisitoriais. Geralmente, as exceções apenas confirmariam a regra. Alguns Inquisidores, por suas virtudes ou pelo sacrifício, chegaram a ser elevados aos altares´.
Em nota (74) diz a autora: ´Não pertenceram ao Santo Ofício português, mas foram santificados os Inquisidores S. Raimundo Penafort, S. Toríbio Mongrovejo, S. Pedro de Verona, mártir, S. Pio V, S. Domingos de Gusmão, S. Pedro de Arbuês, S. João Capistrano. Beatificados foram Pedro Castronovo, legado cisterciense, Raimundo, arcediago de Toledo, Bernardo, seu capelão. Inquisidores também, dois clérigos, Fortanerio e Ademaro, núncios do Santo Ofício de Tolosa, martirizados pelos albigenses, Conrado de Marburg, mártir, pároco e Inquisidor da Alemanha, e o confessor de Sta.lsabel da Hungria, João de Salermo. O Inquisidor da Frísia e Holanda no século XVI, Guilherme Lindano, foi considerado Venerável´ (p. 527).
2.3. A Inquisição Pombalina
´A idéia de separação de um Estado só político e de uma igreja só religiosa germina nessa época´. Pretende´se uma nova política religiosa que usa a tolerância como seu instrumento. Impunha´se conexão com o Absolutismo, ainda então vivo como idéia política. Limitar o poder jurisdicional da Igreja e difundir o espírito laico.
Em meio a esse clima das reformas pretendidas, a questão religiosa punha em relevo o Santo Ofício, tradicional defensor da ortodoxia das crenças, fiel zelador da unidade das consciências. Não se pensa em extingui´lo, mas, sim, em reformá´lo, adequando´o aos novos tempos. Urgia a elaboração de um novo Regimento que tornasse a Inquisição mais inofensiva e pusesse o Tribunal realmente nas mãos da Coroa.
Esse novo Regimento foi mandado executar pelo Cardeal da Cunha. No seu Preâmbulo, justifica´se a sua necessidade na medida em que as leis que geriam o Santo Ofício teriam sido, ao longo dos séculos, distorcidas pelos jesuítas, interessados em dar ao Papa o supremo poder sobre a Inquisição. Desde o governo do Cardeal Infante D. Henrique ´ dominado, diz o Cardeal da Cunha, pelo seu confessor, o jesuíta Leão Henriques ´, até o Reinado de D. João V, foi o Tribunal escapando ao poder do rei. Teria chegado ao máximo a influência da Companhia, sob o Inquisidor D. Pedro de Castilho, que tornou a legislação mais jesuítica do que régia´ (p. 562).
´Os tempos eram diversos. O Estado se configurava de outra maneira, definindo diferentes funções. Cioso de seu poder, recusava´se a partilhá´lo com quaisquer instituições ou estamentos. Impunha´se a necessidade de limitar o poder jurisdicional da Igreja. Assim o Regimento de 1774 visou o fortalecimento do poder da Coroa, invocando o direito do Reino. Instalava´se o regalismo absolutista como ideal de união cristã na ordem civil´ (p. 563).



É importante conhecer os dados históricos dos quais as páginas deste artigo referem apenas alguns poucos traços. Contribuem para repor a verdade em foco, mostrando as causas latentes da Inquisição em Portugal (como também na Espanha). Os estudiosos não podem deixar de exprimir sua gratidão ao Instituto Histórico e Geográfico do Brasil pela publicação do trabalho da Prof. Sônia Aparecida de Siqueira e dos Regimentos da Inquisição Portuguesa (que vigoraram também no Brasil colonial). 

Nenhum comentário: