EXCELÊNCIA DO SANTO SACRIFÍCIO DA MISSA
Por Pe. Martinho de Cochem.
A excelência da Santa Missa é tão grande, que os próprios Serafins
não podem compreendê-la perfeitamente. Experimentemos, entretanto,
investigar os ensinamentos da Igreja a este respeito.
São Francisco de Sales diz:
"O santíssimo Sacrifício do altar é, entre os exercícios da religião,
como o sol entre os astros, porque é verdadeiramente a alma da
piedade e o centro da religião cristã, ao qual todos os seus mistérios
e todas as suas leis se relacionam; é o mistério inefável da divina
caridade, pelo qual Jesus Cristo, dando-se realmente a nós,
cumula-nos com suas graças de maneira igualmente amável e
magnificente" (Introdução à vida devota).
O sábio Osório julga a Santa Missa acima de todos os outros mistérios
da nossa religião:"Entre todos os atos da Igreja, o Santo Sacrifício
da Missa é o mais augusto e mais precioso, porque o
Santíssimo Sacramento do altar é aí consagrado e oferecido a
Deus".E Fornerus de Bamberg acrescenta: "Se bem que todos os
Sacramentos estejam cheios de majestade, a Santa Missa
excede-os; aqueles são vasos que contêm a divina misericórdia
para os vivos, esta é um oceano inesgotável de liberalidade divina
pelos vivos e pelos mortos".
Vejamos agora em que se manifesta a excelência da Santa Missa.
Em primeiro lugar, manifesta-se, no cerimonial pomposo da bênção
solene ou consagração de uma igreja, ou dum altar pelo Bispo. Longo
demais seria narrar aqui toda a cerimônia - aliás rara entre nós,
devido a diversas razões; mas é certo que a consagração das igrejas
é uma cerimônia tão tocante e insinuante, que facilmente dela se
deduz que, das nossas igrejas, muito mais que do templo de Jerusalém,
valem as palavras do profeta Isaías:
"Conduzi-los-ei à montanha santa, enchê-los-ei de alegria, à
invocação de meu nome; a vítima que me oferecerem há de
me ser agradável, porque minha casa será chamada por todos os
povos, casa de oração".
Desta palavra fez menção Jesus Cristo, quando, cheio de santa
indignação, expulsou do templo de Jerusalém os que o violavam
pelos negócios gananciosos. Lembremo-nos, também, desta mesma
palavra para, cheios de santa fé e religioso respeito, entrarmos em
nossas igrejas para adorarmos a Jesus Cristo, corporal e
essencialmente, presente no santo altar. Conservemo-nos alheios
do costume altamente censurável de fazer dos templos sagrados
lugares de conversas e, quiçá, de faltas mais graves.
Em segundo lugar, a excelência da santa Missa nos é demonstrada
pelo rito solene da ordenação dos ministros do altar, mormente
dos sacerdotes. Dispensamo-nos ainda de expor longamente a
administração do santo sacramento da ordem, do sacerdócio,
para não se avolumar demais este livro. Quem já teve ensejo de
assistir à ordenação de neopresbíteros, não terá deixado de
experimentar singular impressão, sentindo a grandeza oculta do
ato, seu efeito duradouro do estado sacerdotal e de seu fim elevado
de oferecer o santo sacrifício da Missa.
Ainda poderíamos referir-nos aos objetos que servem à celebração
da santa Missa e dar outras tantas provas da excelência do mesmo
sacrifício da Missa, pois a grande e rigorosa diligência de nossa santa
Igreja se inspira na compreensão e estima que tem daquilo que se
passa no santo altar. Inspiremo-nos nesta diligência, para
assistirmos sempre com rigorosa atenção a tão grande mistério.
Até a língua empregada no sacrossanto sacrifício da Missa, a Igreja
faz compreender que no altar se efetua algo de superior ao comum.
Não se usa a língua vulgar - mas a língua sagrada da Madre Igreja.
Houve quem ousasse censurar o uso do latim na Missa, - mas
entendamos bem: A santa Missa não é uma instrução, mas um
grande mistério. O sacerdote não celebra para ensinar, mas para
santificar-se e ao povo. Para tomarmos parte na santa Missa,
não é preciso compreendermos as palavras, basta e cumpre
unirmo-nos, afetuosamente, ao que se passa no altar. No
emprego da língua latina no santo sacrifício, temos ainda um
valioso símbolo da unidade da Igreja: Uma só Igreja, um só sacrifício,
uma só língua em todo o mundo no altar.
Passemos agora à prova mais evidente da excelência da santa
Missa, que consiste em demonstrar quem é a pessoa do sacrificador,
e qual a oferta na santa Missa.
Quem é o sacrificador? - o sacerdote? o Bispo? o Papa? - Não.
- Será um Anjo do céu? um Santo? a própria Mãe de Deus,
Maria Santíssima? - Oh, não. É o sacerdote dos sacerdotes,
o Bispo dos Bispos, o Filho de Deus, Jesus Cristo, "o sacerdote
eterno segundo a ordem de Melquisedec".
É ele quem dá à santa Missa a excelência incomparável; é ele
quem eleva a oferta do pão e do vinho a um sacrifício divino.
Que Jesus Cristo é o sacerdote na santa Missa, prová-lo-emos
com estas palavras de S. João Crisóstomo:
"O mesmo Jesus Cristo que nos preparou, na última Ceia,
esta mesa sagrada, está aqui para abastecê-la; pois não
é o homem que muda o pão e o vinho no Corpo e no
Sangue de Nosso Senhor, mas sim Jesus Cristo que, por
nós, foi crucificado".
Com estas palavras S. Crisóstomo prova que Jesus Cristo cumpre,
pessoalmente, a parte essencial da santa Missa; que desce do
céu, muda em seu Corpo e Sangue, o pão e o vinho,
oferecendo-se, em holocausto, a seu Pai pela salvação do mundo,
e ora, como fiel mediador, pelos pecados do povo. Os sacerdotes
são apenas seus instrumentos: emprestam-lhe a boca, a língua, as
mãos para a realização do divino Sacrifício.
Se alguém recusar crer no testemunho de S. Crisóstomo, eis a
decisão do grande Concílio de Trento:
"O Sacrifício da Cruz e o Sacrifício da Missa são um só e
mesmo sacrifício, porque aquele que se imolou sobre a
Cruz, de maneira cruenta, é o mesmo que se imola na
santa Missa, de modo incruento, pelo ministério dos sacerdotes".
É pois, doutrina da santa Igreja, que os sacerdotes são simplesmente
os servos de Jesus Cristo e que Nosso Senhor se oferece, no altar,
tão verdadeiramente como se ofereceu sobre o patíbulo da Cruz.
Que honra! que graça! que inestimável benefício! O divino Salvador
digna-se de fazer-se nosso sacerdote, nosso mediador, nosso advogado!
Eis o que também refere S. Paulo em sua Epístola aos Hebreus:
"Era justo que tivéssemos um pontífice como este: santo, inocente,
sem mancha, segregado dos pecadores, e mais elevado que os
céus, que não fosse obrigado, como os outros pontífices, a oferecer
vítimas, todos os dias, primeiramente pelos próprios pecados e,
em seguida, pelos pecados do povo. A lei antiga estabeleceu, para
pontífices, homens fracos, mas a palavra de Deus, confirmada
pelo juramento que fez depois da lei, constituiu pontífice o Filho,
que é santo e perfeito eternamente" (Heb. 7, 26-28).
Não são estas magníficas palavras do Apóstolo uma prova de quanto
Deus nos estima, visto que nos deu, por sacerdote e mediador, não
um homem frágil e pecador, mas seu Filho único, a própria santidade?
Consideremos, agora, por que Jesus Cristo não quis confiar seu sacrifício
a homem nenhum. A principal razão foi porque este sacrifício devia
ser puríssimo como o profeta Malaquias o havia anunciado.
Em todo lugar, sacrifica-se e oferece-se ao meu nome uma oblação
pura. Foi por esta razão que Deus reservou o nome a função de
sacerdote a seu Filho único, ao sacerdote eterno segundo a ordem
de Melquisedec.
Deste modo, o sacerdote celebrante não é propriamente falando, o
sacrificador, porém apenas o servo do grande sacerdote Jesus Cristo.
Segue-se daí, que toda Missa é de um valor infinito, pois é celebrada
pelo próprio Jesus Cristo, com uma devoção, um respeito, um amor
acima do entendimento dos Anjos e dos homens. O mesmo Jesus Cristo
revelou esta verdade à Santa Matilde:
"Só Eu, disse, compreendo, perfeitamente, de que forma me
imolo, todos os dias, sobre o altar pela salvação dos fiéis;
os Querubins e os Serafins, nenhuma Potestade celeste, saberiam
compreende-la inteiramente" (Revelações, I, 19).
Oh meu Jesus! que impenetrável mistério e que felicidade para nós,
pobres pecadores, sermos admitidos à santa Missa, onde efetuais
essa salutar oblação!
Caro leitor, considera bem estas palavras e quanto te é vantajoso
assistir à santa Missa, em que Nosso Senhor se oferece por ti;
faz-se o mediador entre tua culpabilidade e a justiça divina, e retém
o castigo que merecem, cada dia, os teus pecados. Oh, se abrisses
bem os olhos a esta verdade, como amarias a santa Missa; como
suspirarias pela felicidade de assisti-la. Como a ouvirias devotamente.
Como te lastimarias por faltar a uma só! Para poupar um tal prejuízo
a tua alma, suportarias, de boa vontade, qualquer dano temporal.
Os primeiros cristãos nos deixaram disto o exemplo: preferiram perder
a vida a deixar de assistir à santa Missa.
Já insistimos muito na excelência da santa Missa; entretanto, resta-
nos ainda a tratar de um ponto importante: o valor da oferta,
apresentada à Santíssima Trindade.
É evidente que esta oferta, para ser digna de Deus, deve ser de um
preço inestimável, porque quanto maior é a quem se faz uma oferta,
tanto mais preciosa ela deve ser. Se alguém ousasse oferecer uma
bagatela a um príncipe, cobrir-se-ia de confusão
Ora, o céu e a terra são apenas uma bagatela diante da imensa
Majestade de Deus.
"O mundo, perante Deus, é o grãozinho que apenas dá
diminuta inclinação à balança, a gota do orvalho da manhã,
que cai sobre a terra" (Sabedoria, 11, 23).
Então, onde achar, no universo inteiro, alguma coisa digna de Deus?
Que acharia Jesus Cristo, mesmo no céu, que fosse digno de Deus?
No céu e sobre a terra achou apenas sua santa, imaculada e bendita
Humanidade, isto é, o que a onipotência de Deus produziu de maior.
"A Humanidade de Jesus Cristo, disse Nossa Senhora à Santa
Brígida, foi, e será para sempre, o que há de mais precioso".
Com efeito, a mão liberalíssima de Deus ornou esta Humanidade
de tantas graças e perfeições que nada mais lhe podia
acrescentar. Não porque Deus não pudesse, absolutamente,
conceder mais, porém porque a capacidade da humanidade não
as poderia conter.
Todavia, esta Humanidade tão bela, tão pura, tão santa
e perfeita, não pode oferecer um sacrifício digno da adorabilíssima
Trindade senão em razão de sua união com a pessoa do Verbo
eterno, união que dá a todos os seus atos e sacrifícios um valor e
merecimento infinitos.
Por esta grande dignidade, durante sua permanência na terra,
a santa Humanidade do divino Salvador atraiu a mais profunda
veneração, não só de homens piedosos como também de Anjos
do céu. Que adoração universal, porém, é prestada agora a
esta santa Humanidade no céu, onde se acha gloriosa e imortal
em um trono, à direita do Pai celeste!
A santíssima Humanidade de Jesus Cristo forma a única oferta
digna de ser apresentada no santo Sacrifício, e, na verdade, é
o mesmo Jesus Cristo quem a oferece. Com ela, oferece tudo
o que efetuou e sofreu durante os trinta e três anos de sua vida
mortal: jejuns, vigílias, orações, viagens, mortificações, pregações,
perseguições, insultos, zombarias, lágrimas, gotas de suor,
agonia no jardim das oliveiras, flagelação, coroação de espinhos,
crucificação, morte e sepultura. Além disto, oferece a Humanidade,
inseparavelmente unida à Divindade, porque, embora a Divindade
não seja objeto do sacrifício, a Humanidade é nele oferecida no
estado de perfeição a que a eleva à união hipostática.
Medi, pois, se podeis, o valor de uma tal oferta. Enfim,
Jesus Cristo não oferece sua Humanidade sob a forma
que tem no céu, mas no estado em que se acha sobre
o altar. No céu ela é tão gloriosa que os Anjos tremem
ante sua Majestade: no altar, pelo contrário, sua
humilhação é tão extrema que estes mesmos se enchem
de espanto.
A Humanidade de Nosso Senhor está, de tal modo, unida
e estreitada às espécies eucarísticas que nunca se podem
separar, nem mais aí subsistirá, quando forem destruídas as
espécies. De que modo contempla a Santíssima Trindade este
prodígio de humanidade! Que glória para o Pai celeste! Que
virtude, que perfeição não recebe daí a santa Missa onde
se cumprem estes divinos Mistérios! Que bênção, que
socorro para aqueles em cujas intenções o santo Sacrifício
é oferecido! Que consolação, que alívio não recebem as
almas do purgatório, quando a santa Missa é celebrada, ou
ouvida pelos seu livramento!
A Missa quotidiana é a arma, pela qual a graça e a
misericórdia sobressaem à justiça.
Agradeçamos, pois, ternamente ao divino Salvador por
nos ter legado, a nós, seus pobres filhos, um sacrifício
tão poderoso; agradeçamos-lhe por nos ter
deixado este meio infalível de atrair as ondas da
divina misericórdia.
Para glória da santa Missa, relatamos como se fez a
consagração da capela d'Einsiedeln, na Suíça, e como
o mesmo Nosso Senhor Jesus Cristo celebrou o santo
Sacrifício como grande solenidade.
Oitenta anos depois da morte de Meinrado, o santo
eremita Eberardo, piedoso solitário de nobre família, foi
pedir a S. Corado, Bispo de Constança, a graça de
consagrar a capela de S. Meinrado. O virtuoso Bispo
anuiu-lhe ao pedido. Na festa da Exaltação da santa
cruz, em 14 de setembro de 940, devia realizar-se a
consagração.
Mas, indo para a capela, a fim de entregar-se à oração,
o santo Bispo ouviu os coros dos Anjos cantar as antífonas
e os responsórios da consagração. Entrou e viu a capela
cheia de Anjos, e, no meio deles, Nosso Senhor, que,
revestido de paramentos episcopais, procedia à consagração
do santuário. À vista disto, Conrado caiu em santo êxtases,
sem, entretanto, nada perder de sua atenção. Viu e ouviu
Nosso Senhor pronunciar as palavras da Igreja e desempenhar-lhe
as cerimônias em igual festa. Os apóstolos, os Anjos e uma
multidão de Santos assistiam-lhe. A Mãe de Deus, a quem o
altar e a capela eram dedicados, aparecia em cima do altar,
[mais brilhante que o sol, mais resplandecente que o fulgor do relâmpago.
Terminada a consagração, o Senhor começou a Missa solene,
depois da qual toda a corte celeste desapareceu, deixando
Conrado em transporte de alegria.
Reconheceu, sobre as cinzas que cobriam o solo, as marcas dos
pés do Salvador e, sobre as paredes, os traços das unções.
De manhã, o clero veio buscar o Bispo para fazer a sagração,
porém ele disse: "Não posso consagrar este santuário, porque
já foi consagrado de maneira misteriosa".
Insistem, forçam-no, quando uma voz celeste se faz ouvir e
repete por três vezes:"Pára, meu irmão, a capela já está
consagrada".
Mais tarde, S. Conrado referiu ao Papa Leão VIII este fato
extraordinário, cuja veracidade o mesmo Papa afirmou num
rescrito apostólico, em que proibiu tornar a consagrar a
capela, e concedeu indulgências especiais aos fiéis, que
a frequentassem (Legende der Heiligen von Ott, p. 2326).
Caro leitor, dizes, com certeza: "Ah! se pudesse assistir a
uma festa igual, ver o que viu S. Conrado, ouvir o que ele
ouviu! Que prazer, que emoção!".
Entretanto, não está presente, em cada Missa, Nosso
Senhor, o grande pontífice? Não nasce, em cada Missa,
sobre o altar, e não o cercam os Anjos?
Feliz serás, pois, se considerares que te achas no meio de uma
tão alta assembléia, que se digna de unir tuas pobres orações
às suas, para fazê-las subir até o trono de Deus.
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