Blog Alma Missionária

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quinta-feira, 26 de setembro de 2013

O preço das palavras


A comunicação não deveria estar submetida ao humor das pessoas
Por Guilherme Rezende

Sinto com relativa frequência a falta de algumas palavras no diálogo entre as pessoas. Bom dia, por favor, muito obrigado e outras não menos importantes parecem pesadas ou caras demais para serem proferidas. Tal situação me faz pensar que, de algum modo, certas palavras têm um custo muito alto para algumas pessoas. 

Num exercício de imaginação, pensei como seria uma feira de palavras, e como os vendedores explicariam o uso excessivo de algumas e a quase extinção de outras. Numa bela manhã de domingo, partiria para a feira e visitaria cada barraca para conhecer melhor as palavras e o custo de sua fabricação. 

- Olá, gostaria de comprar algumas palavras.

- Senhor, de quais palavras você precisa? Responde o vendedor meio ressabiado.

- Bom, como estamos num domingo, vou precisar de alguns exemplares do ‘bom dia’, do ‘por favor’ e do ‘muito obrigado’ para usar na segunda-feira.

- Senhor, essas palavras são difíceis de encontrar no domingo.

- Por quê? Pergunto com espanto.

- Para conseguirmos uma boa produção para a segunda-feira muitas pessoas devem estar de bom humor, de bem com a vida pessoal, profissional e o time delas não pode perder no futebol no fim de semana. 

- Bem complicado ter todos esses desejos realizados. Ressaltei observando o vendedor concordar comigo.

- Você pode comprar alguns verbos no imperativo, sem a presença do ‘por favor’ e do ‘por gentileza’ que estão em falta. Como por exemplo ‘faça’, ‘execute’, ‘aprenda’, ‘resolva’, e ainda de brinde o senhor pode levar o ‘agora’ que está em alta produção e tem o custo bem baixo.  

Voltando ao mundo real, a comunicação não deveria estar submetida ao humor das pessoas. Cada encontro, diálogo, interação, são um oportunidade única de crescimento. Imagina se o motorista de um ônibus coletivo decidisse dirigir sem responsabilidade só por que teve uma discussão com a esposa na noite anterior. É evidente que a maneira como nos expressamos traz consigo boa parte do nosso estado emocional. Um narrador de futebol transmite emoções e por isso, obrigatoriamente, deve senti-las. Por outro lado, imagine um médico dando a notícia de uma doença rara e sem cura para o paciente de forma ríspida e descompromissada por que bateu o carro antes de chegar ao hospital? 

Certa vez chegava à empresa onde trabalho e por alguns minutos procurei vaga para estacionar. Consegui uma vaga um pouco longe da entrada. Quando iniciei a baliza um sujeito muito educado se aproximou e disse: - bom dia. O senhor poderia me dar um pouco de sua atenção? Acenei positivamente e ele prosseguiu: - estamos em obras nesta casa e vamos receber dentro de instantes um caminhão com brita. O senhor, por gentileza, e se não for nenhum incomodo, poderia estacionar em outra vaga até que o material seja descarregado? Confesso que diante de tanta educação e mostra de domínio das palavras prontamente atendi ao pedido e parei o carro em outra vaga. Alguns minutos depois recebo um telefonema da portaria dizendo que um colega de trabalho estava discutindo agressivamente com um operário da obra ao lado da nossa empresa. Chegando ao local percebi que não era o mesmo senhor que havia me abordado que discutia com meu colega. O outro operário não era nem um pouco educado e muito menos sabia o valor das palavras bem empregadas. Resultado: o carro do meu colega continuou no espaço onde o caminhão deveria estacionar e os operários tiveram um trabalho dobrado para transportar o material.

O uso correto das palavras nos dá a possibilidade de abrir portas, fazer novos amigos, ampliar nosso conhecimento e principalmente, evita o desgaste do não-entendimento e das querelas que se iniciam com uma frase mal interpretada.

João Batista Libânio é teólogo jesuíta. Licenciado em Teologia em Frankfurt (Alemanha) e doutorado pela Universidade Gregoriana (Roma). É professor da FAJE (Faculdades Jesuítas), em Belo Horizonte. Publicou mais de noventa livros entre os de autoria própria (36) e em colaboração (56), e centenas de artigos em revistas nacionais e estrangeiras. Internacionalmente reconhecido como um dos teólogos da Libertação. 

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