Blog Alma Missionária

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quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

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Nas trevas de um mundo pagão,
quando menos se pensava e onde menos se esperava,
uma luz muito pura se acendeu
“Nesta luz havia o anúncio da hora da Encarnação, a promessa implícita da Redenção tão esperada, e da nova era que começou para o mundo com o incêndio de Pentecostes.
É o esplendor dessa luz, inaugurando nas trevas uma aurora que triunfalmente se transformou em dia, é o cântico de surpresa e esperança diante dessa renovação sobrenatural, o anelo e o antegosto de uma ordem nova baseada na fé e na virtude, que os fiéis de todos os séculos se comprazem em considerar, quando seus olhos se detêm no Menino-Deus deitado na manjedoura, a sorrir enternecido para a Virgem-Mãe e seu castíssimo Esposo”.
      Sob o título “Hodie in terra canunt angeli, lætantur archangeli; hodie exsultant justi” (tradução no título abaixo), o artigo que segue foi estampado em Catolicismo na edição alusiva ao Natal de 1957. Decorridos 55 anos, embora o latim de seu título esteja infelizmente muito esquecido, a matéria mantém-se atualíssima. Com algumas pequenas alterações, quase se poderia dizer que foi redigida para o Natal deste ano. O nascimento do Menino-Deus é uma celebração perene. Será comemorado até os fins dos tempos, e por toda a eternidade no Céu junto ao Divino Redentor, que — tendo se encarnado no seio puríssimo da Santíssima Virgem — para nos salvar veio à Terra na sublime noite do primeiro Natal. “Uma luz brilhou nas trevas!”.
A Direção de Catolicismo
“Hoje na Terra os anjos cantam, os arcanjos se alegram; hoje os justos se exultam”
Plinio Corrêa de Oliveira
         Na liturgia, a festa do Natal ocupa certamente um lugar considerável. A piedade dos fiéis dela fez uma das datas mais relevantes do ano. E isto por várias razões. O nascimento do Salvador constituiu em si mesmo uma honra de infinito valor para o gênero humano. Poderia o Verbo de Deus unir hipostaticamente a Si algum dos anjos mais santos e rútilos das alturas celestes. Pelo contrário, preferiu ser homem, fazer-se carne, pertencer por sua humanidade à descendência de Adão. Dom absolutamente gratuito, para nós nobilitação de um valor inefável, ponto de partida histórico de outros dons, também eles insondáveis.
No “epílogo” do mundo, o nascimento do Redentor
         Assim, na previsão de que o Verbo se encarnaria, já a Providência criara um ser que continha em si perfeições maiores que as de todo o universo reunido, e para Ele suspendera a sucessão hereditária do pecado original. Dos méritos previstos da Redenção, se alimentara a virtude de todos os justos da antiga lei. Mas essa multidão de eleitos estava sentada “às portas da morte” (Sl. 106, 18), à espera de que se imolasse por todos nós o Cordeiro de Deus.
         E não eram só eles que esperavam parados. Por assim dizer, parada numa muda expectativa estava toda a História. No momento em que Jesus Cristo nasceu, o mundo conhecido vivia num período de epílogo. Florescera o Egito e, chegado a uma certa culminância, ruíra. O mesmo se poderia dizer dos outros povos: caldeus, persas, fenícios, citas, gregos e tantos mais. Por fim, os romanos estavam também a ponto de entrar no longo ocaso que, com períodos de decadência rápida, de estagnação mais ou menos prolongada, de efêmera reação, conduziu de Augusto a seu remoto sucessor e seu miserável homônimo, Rômulo Augústulo.
         Todos estes impérios tinham subido suficientemente alto para atestar a profundidade e a variedade dos talentos e capacidades dos respectivos povos. Mas o nível mais ou menos igual a que todos se haviam alçado não estava à altura das aspirações das almas verdadeiramente nobres. Dir-se-ia que essas magníficas civilizações haviam deixado patente, não tanto o que tinham, mas o que lhes faltava, e a incurável incapacidade do talento, da riqueza e da força dos homens para construir um mundo digno deles.
Quando o Menino Jesus nasceu, os justos eram os “marginais”
         Tudo isto constituía na Ásia, como na África ou na Europa, uma atmosfera irrespirável, que acrescia o tormento dos escravos em sua vida já tão miserável e minava secretamente os lazeres e os deleites dos ricos. Opressão imponderável mas onipresente, impalpável mas evidente, indescritível mas muito definida. O curso da História encalhara num lodaçal de corrupção, cheio de escombros do passado, no qual só as formas doentias de vida ainda se patenteavam.
         Assim, no terreno político, um fim de luta entre duas expressões de demagogia: anárquica e arruaceira, ou militar e despótica. No terreno cultural, o ceticismo religioso, a devorar as idolatrias antigas. No terreno internacional, as várias pátrias acabando de se deteriorar no recipiente do Império, para constituir esse moloch cosmopolita anorgânico em que Roma se transformou. No terreno moral, a depravação dos costumes dominando a existência quotidiana. No terreno social, o ouro arvorado em valor supremo.
         Para os bem-instalados, as coisas corriam aprazivelmente, na aparência. Mas em épocas tais, os bem-instalados são habitualmente a vasa moral e intelectual do país. E padecem, exatamente os melhores, os mil tormentos das situações imerecidas e inadequadas. Haja vista o quadro do povo eleito, no momento em que o Verbo se encarnou. Herodes cingira o diadema de Rei. De fato era, porém, um celerado, dos piores do reino, medíocre, cúpido, cruel, consciente instrumento do opressor para iludir os judeus com as aparências de uma realeza vã. Os sacerdotes eram, no que diz respeito ao espírito de fé, à sinceridade e ao desprendimento, a ralé da Sinagoga. A casa real de David vivia desprezada e na maior obscuridade. Os justos eram os “marginais” dessa ordem de coisas tão fundamentalmente má, que acabou por excluir de si e matar o Justo. Então, o que mais? Era o fim.
“A luz brilhou nas trevas”
         Pois foi nas trevas deste fim que, quando menos se pensava e onde menos se esperava, uma luz muito pura se acendeu. Nesta luz havia o anúncio da hora da Encarnação, a promessa implícita da Redenção tão esperada, e da nova era que começou para o mundo com o incêndio de Pentecostes.
É o esplendor desta luz, inaugurando nas trevas uma aurora que triunfalmente se transformou em dia, é o cântico de surpresa e esperança diante dessa renovação sobrenatural, o anelo e o antegosto de uma ordem nova baseada na fé e na virtude, que os fiéis de todos os séculos se comprazem em considerar, quando seus olhos se detêm no Menino-Deus deitado na manjedoura, a sorrir enternecido para a Virgem-Mãe e seu castíssimo Esposo.
Mundo hodierno — semelhança com os tempos do paganismo
         Também hoje, uma imensa opressão pesa sobre nós. É inútil tentar disfarçar a gravidade da hora, pondo em ação as castanholas e os pandeiros de um otimismo já agora sem repercussão. Com a única diferença de que temos em nossos dias a Santa Igreja, a situação do mundo é terrivelmente parecida com a do tempo em que ocorreu o primeiro Natal.
         Também entre nós o comunismo marca um fim. É o epílogo da decadência religiosa e moral iniciada com o protestantismo no século XVI. Nesse epílogo se esvai o mundo burguês, cada vez mais intoxicado de sincretismo, socialismo e sensualidade. E como se isto não bastasse, o sistema comunista acelera este processo de decadência, difundindo seus erros em todos os países. [Nota da Redação: hoje em dia o comunismo continua atuante, se bem que metamorfoseado sob formas várias de socialismo e de ecologismo; entretanto na China, em Cuba, no Vietnã, na Coréia do Norte e no Laos, permanece em sua forma primeira].
         Temos entre nós a Igreja, é verdade. Mas essa augusta e sobrenatural presença não salva, senão na medida em que os homens lhe aceitam a influência. Se a repelem, estão por alguns aspectos mais expostos ao castigo do que os próprios pagãos. Os judeus tiveram entre eles o Homem-Deus. Rejeitaram-no e foram punidos por uma ruína mais terrível e muito mais próxima que a dos romanos.
E a situação da Igreja em nossa época?
         Ora, qual é a situação da Igreja em nossos dias? Temos vontade de sorrir, e mais ainda de chorar, quando alguém nos diz pura e simplesmente que é boa. É claro que, por alguns lados, essa situação pode ser dita boa. Mais ou menos como se poderia dizer, no Domingo de Ramos, que era grande o entusiasmo dos judeus para com Nosso Senhor. Mas dizer que a situação da Igreja é boa hoje em dia, no conjunto de seus aspectos, e tomados na devida conta os fatores positivos e negativos, há nisto uma afronta à verdade.
         Com efeito, só é boa para a Igreja a situação em que a cultura, as leis, as instituições, a vida doméstica e cotidiana dos particulares são conformes à Lei de Deus. Que tal não se dá hoje, nada é mais notório. Então, por que tapar o sol com uma peneira?
         Que os bem-instalados possam desejar a duração desta lenta agonia, é compreensível. Também os micróbios, se pudessem pensar, prefeririam matar lentamente sua vítima, pois a agonia desta é a opulência deles; e a morte dela será morte para eles também. Indivíduos que em geral não têm mérito para estar onde os ventos do caos os levaram têm todas as razões para desejar que não volte a ordem, pois nesse caso voltariam ao pó.
         Mas eles próprios não podem escapar ao mal-estar profundo do momento que passa, e não podem deixar de estremecer com os relâmpagos que se desprendem, sempre mais frequentes, da atmosfera saturada.
A voz de Fátima — renova no mundo as alegrias do primeiro Natal
         No alto, porém, dessa montanha sagrada que é a Igreja, coroada pelo diadema régio com que lhe cingiu a fronte o Legado — tão querido dos brasileiros — que a piedade do imortal Pio XII para este ato constituiu, ergue-se a imagem maternal e melancólica de Nossa Senhora de Fátima.
         E de lá partem para o mundo opresso as claridades de esperança que lhe veio trazer a Rainha do Universo, claridades que suscitam entre nós esperanças análogas às que a Boa Nova despertou na humanidade antiga. Análogas, é dizer pouco. São claridades que brotam da Igreja, e, pois, de Jesus Cristo. Claridades que simplesmente prolongam e reafirmam as da primeira noite de Natal.
         “Por fim meu Imaculado Coração triunfará” — disse a Virgem em sua terceira aparição na Cova da Iria.
         Ó neopaganismo, mil vezes pior que o paganismo antigo, teus dias estão contados! Cairá o poderio comunista, e ruirá também a influência da Revolução gnóstica e igualitária no Ocidente. Nossa Senhora o disse. E diante d’Ela são impotentes todos os grandes da Terra e todos os príncipes das trevas.
A derrota para sempre “do demônio, do mundo e da carne”
         O triunfo do Imaculado Coração de Maria, o que pode ser, senão o reinado da Santíssima Virgem, previsto por São Luís Maria Grignion de Montfort? E esse reinado, o que pode ser, senão aquela era de virtude em que a humanidade, reconciliada com Deus, no regaço da Igreja, viverá na Terra segundo a Lei, preparando-se para as glórias do Céu?
         Neste conturbado ano, não pensemos em “sputniks” nem em bombas de hidrogênio, na noite de Natal, senão para confirmar nossa convicção de que Jesus Cristo venceu para todo o sempre o demônio, o mundo e a carne, e prepara dias da mais alta glória para sua Mãe Imaculada, que resplandecerão depois de provas terríveis.


Só é boa para Igreja a situação em que a cultura, as leis, as instituições, a vida doméstica e cotidiana dos particulares são conformes à lei de Deus. Qual tal não se dá hoje, nada é mais notório

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