Blog Alma Missionária

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segunda-feira, 7 de janeiro de 2013


As duas asas

Muitos atualmente tem a idéia de que a fé da Santa Igreja é algo irracional, ou seja, algo que se contrapõe à razão. Há inclusive os que tem um desejo sincero de viver a fé católica, mas enganados por falsas ideologias, ignoram que a fé católica seja um ato perfeitamente compatível com a razão; acreditam estes que a fé é um sentimento fruto de uma experiência pessoal, e por isso mesmo não vivem uma fé madura. Tais ideologias podem ter raízes tanto no relativismo moderno como também no sentimentalismo protestante.
A teologia católica define a fé como uma adesão da inteligência à verdade revelada por Nosso Senhor (Catecismo da Igreja Católica, 155), conservada e transmitida a nós pelo Sagrado Magistério da Santa Igreja. Nesse sentido, São Paulo, escrevendo aos Hebreus, diz que a fé é uma "certeza a respeito do que não se vê" (Hb 12,1). Ou seja: fé não é sentimento! Fé é certeza; é adesão da inteligência; a fé é um ato que, embora transcenda a razão, é perfeitamente compatível com ela. Por isso mesmo o Papa João Paulo II escreve que "a fé e a razão constituem como que as duas asas pelas quais o espírito humano se eleva para a contemplação da verdade." (FR, 1) Antes disso, o Concílio Vaticano I em 1870 já havia definido dogmaticamente, a respeito da fé e da razão: "Jamais pode haver verdadeira desarmonia entre uma e outra, porquanto o mesmo Deus que revela os mistérios e infunde a fé, dotou o espírito humano da luz da razão; e Deus não pode negar-se a si mesmo, nem a verdade jamais contradizer à verdade. A vã aparência de tal contradição nasce principalmente ou de os dogmas da fé não terem sido entendidos e expostos segundo a mente da Igreja, ou de se terem as simples opiniões em conta de axiomas certos da razão." (CVI, 1797)
Quando se fala aqui que a fé é uma ato perfeitamente compatível com a razão, de forma alguma se quer aderir ao racionalismo, que surge com força no final da idade média com os filósofos iluministas. Segundo os racionalistas, a luz natural da razão é o único caminho para o homem adquirir o conhecimento, excluindo a possibilidade de uma doutrina conhecida por Revelação Divina. Já a Santa Igreja, contrapondo-se ao racionalismo, nos ensina as verdades reveladas por Deus ao homem através de Nosso Senhor Jesus Cristo não estão ao alcance da luz natural da razão, e não poderiam ser conhecidas se não fossem divinamente reveladas. Todavia, são verdades que são conhecidas e reconhecidas como tal racionalmente, isto é, pela inteligência, e é neste sentido que a fé e a razão se unem e tornam a fé um ato perfeitamente compatível com a razão.
Por isso, cabe perguntar-nos: de que forma a razão humana pode reconhecer a fé católica como divinamente revelada? O primeiro passo para isso é o reconhecimento da existência de Deus. Se as verdades que conhecemos por Revelação Divina não poderiam ser conhecidas pela luz natural da razão, diferentemente se dá com o reconhecimento da existência de Deus. O Concílio Vaticano I definiu dogmaticamente que a "Santa Igreja crê e ensina que Deus, princípio e fim de todas as coisas, pode ser conhecido com certeza pela luz natural da razão humana, por meio das coisas criadas." (CVI, 1785) Tal doutrina já havia sido desenvolvida séculos antes por São Tomás de Aquino, doutor da Santa Igreja, que se utiliza da filosofia de Aristóteles para provar racionalmente a existência de Deus, através da teoria das causas. A este respeito, escreve o Prof. Carlos Ramalhete: " É impossível que um acontecimento no futuro cause uma coisa no passado; a chuva não pode cair sem que as nuvens tenham sido formadas pela evaporação do mar, e o mar não pode ser evaporado sem o calor do sol, etc. Seria impossível que a chuva caia antes que a nuvem tenha sido formada, e a nuvem não pode ter sido formada sem haver o sol, etc. Ora, é necessário que haja algo que causou sem ser causado. (...) A própria teoria científica do Big-Bang exige que haja Alguém, anterior à existência de tudo o mais, que tenha causado esta súbita expansão de todo o universo."
Reconhecendo a existência de Deus, a razão humana pode reconhecer a fé católica como divinamente revelada, ao conhecer os sinais exteriores disso. A este respeito, o Concílio Vaticano I nos ensina: " Não obstante, para nossa fé estivesse em conformidade com a razão (Rm 12,1), quis Deus ajuntar ao auxílio interno do Espírito Santo os argumentos externos da sua revelação, isto é, os fatos divinos, e sobretudo os milagres e as profecias, que, por demonstrarem abundantemente a onipotência e a ciência infinita de Deus, são sinais certíssimos as revelação divina, acomodados que são à inteligência de todos." (CVI 1790) O atual Catecismo da Igreja Católica acrescenta: "Os milagres de Cristo e dos santos, as profecias, a propagação e a santidade da Igreja, sua fecundidade e estabilidade constituem sinais certíssima da Revelação, adaptados à inteligência de todos, motivos de credibilidade que mostram que o assentimento de fé não e de modo algum um movimento cego de espírito." (Catecismo da Igreja Católica, 156) Neste sentido, os Santos Apóstolos e os demais discípulos de Nosso Senhor foram os primeiros a reconhecer estas provas exteriores a Revelação Divina, ao verem os milagres realizados por Nosso Senhor. E como não pensar aqui nos grandes milagres que a história da Santa Igreja tem registrado, como o conhecido Milagre Eucarístico de Lanciano e as incorrupções dos corpos de santos canonizados (como São João Maria Vianney e Santa Catarina Labouré), onde a própria ciência declamou que não tem explicação?
É importante lembrar, por fim, que a fé, como todo ato de virtude, só é possível a nós pela ação do Espírito Santo, como diz o Catecismo da Igreja Católica: "Crer só é possível pela graça e pelos auxílios interiores do Espírito Santo." (154) A teologia nos ensina que, na fé, "não é possível a nossa adesão sem o influxo da vontade que ordena à inteligência que estude os motivos de crer, e quando estes são convincentes, lhe manda ainda que dê seu assentimento. E como se trata de um ato sobrenatural, deve intervir a graça, para iluminar a inteligência e para auxiliar a vontade." (Compêndio de Teologia Ascética e Mística, Ad. Tanquerey, 1170) Por isso, movidos pelo Espírito Santo e pela nossa vontade, podemos racionalmente reconhecer a existência de Deus e os sinais que manifestam a nós que a fé católica é divinamente revelada, e a partir daí, viver um encontro pessoal com Nosso Senhor, que neste sentido é verdadeiramente uma experiência de fé. O encontro com Nosso Senhor é real, mas o ato da fé é anterior a ele, mesmo que por vezes tal ato não seja maduro em sua plenitude. E a partir deste ato de fé, podemos aderir de forma consciente e madura a Nosso Senhor e à Sua Santa Igreja.
Todavia, há múltiplas razões que podem dificultar o reconhecimento racional da fé católica como divinamente revelada e o próprio reconhecimento racional da existência de Deus. Dom Estevão Bettencourt (Pergunte e Responderemos 445 - pp. 242-250) cita aqui tanto a ignorância em matéria religiosa, as correntes filosóficas equivocadas (como o racionalismo), como também o orgulho e a sensualidade que Satanás se utiliza para impedir que o homem se reconheça dependente de Deus e renuncie ao seus pecados. É preciso lembrar, porém, que muitos podem não ter aderido a fé católica e não serem culpados com isso, seja por não terem tido a oportunidade de conhecer a Santa Igreja, seja por um determinado tipo de resistência psicológica inconsciente que os impede de reconhecer a verdade como tal. Porém, aqueles que aderiram à Nosso Senhor e à Sua Santa Igreja podem, com Santo Agostinho, afirmar: "Inquieto está o nosso coração, até que descanse em Deus."
Francisco Dockhorn, 27/03/2006

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